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Tainá de Paula

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Realengo, Nova York e Berlim: espaços verdes urbanos e mudanças climáticas

Floresta da Tijuca é a terceira maior floresta urbana do mundo - Alexandre Macieira/Riotur
Floresta da Tijuca é a terceira maior floresta urbana do mundo Imagem: Alexandre Macieira/Riotur

Tainá de Paula

19/09/2021 06h00

A devastação ambiental em espaços urbanos não é novidade, mas com o avanço das mudanças climáticas isso se torna ainda mais grave. O relatório do IPCC de 2018 defende a limitação do aumento da temperatura média do planeta a "apenas" 1,5ºC, o que já é problemático, mas menos que um aumento de 2ºC. Por exemplo, o relatório mostra que esse aumento de 1,5ºC representa risco muito alto para corais de águas quentes e risco alto para alagamento de áreas costeiras. Além de efeitos específicos em sistemas naturais ou manejados pelo ser humano, as mudanças climáticas significam alteração de ciclos e correntes (marítimas e de ar, por exemplo), mudanças em ritmos de chuva (e, consequentemente, de secas) e aumentam a intensidade e a frequência de eventos extremos, como furacões e tufões. Recentemente vimos mais um furacão atingir o Haiti, matando mais de 2 mil pessoas, além dos alagamentos de grandes proporções em Nova York e em algumas cidades da Alemanha e da Bélgica.

No Brasil, vemos a antecipação e o aumento de queimadas no Cerrado e no Pantanal. Paralelo aos fenômenos naturais que têm se intensificado, acompanhamos os incêndios criminosos no Cerrado e o avanço acelerado do desmatamento da Amazônia.

Sabemos que a Mata Atlântica é o bioma brasileiro mais destruído: atualmente só temos 7,3% da área original. A cidade do Rio de Janeiro tem a Mata Atlântica como bioma dominante, e é no Rio que se encontra, mesmo com toda a devastação, a maior floresta urbana do mundo, o Parque Estadual da Pedra Branca, e a terceira maior, a Floresta da Tijuca (o segundo lugar também é no Brasil, o Parque da Cantareira, em São Paulo). Ao olhar o mapa do Rio, um elemento que chama atenção e ilustra essa devastação é a separação entre os maciços da Tijuca e da Pedra Branca: o que antes era uma só grande área - contígua -, hoje se separa ali na zona oeste, entre Jacarepaguá e Sulacap.

Os bairros da Zona Oeste que ficam "atrás" (em relação ao mar) do Parque da Pedra Branca estão entre os mais quentes da cidade. Isso se dá porque o Parque impede a passagem de correntes frescas que vêm do mar, e esses bairros ficam em um vale (uma região mais baixa) que não recebem ventos de outros lugares. Essa organização geográfica e climática é natural, mas isso não significa que esses bairros eram (e, principalmente, que têm que continuar sendo) tão quentes quanto são hoje em dia. A devastação do bioma da região - Mata Atlântica - entra como um fator importante para o aumento da temperatura da região.

A existência de áreas verdes em centros urbanos é fundamental para controle da temperatura e da umidade. O concreto dos edifícios e o asfalto do calçamento retêm calor, então áreas verdes são importantes para essa regulação. Áreas verdes são também espaços importantes de socialização - parques são espaços de lazer, de descanso, de aproximação com a natureza (cada vez mais difícil para quem vive em áreas urbanas) e, por que não, espaços educativos, onde a população pode entender melhor alguns ciclos naturais.

Um exemplo é o Central Park, que fica incrustado na ilha de Manhattan, em Nova York, e é cercado por altíssimos prédios e por um tráfego muito intenso, a todo o tempo. O Central Park é fundamental para a regulação da temperatura e da umidade da ilha, mas também se mostrou importante para minimizar o efeito de eventos extremos - que, como já mencionei, ficarão cada vez mais frequentes com as mudanças climáticas. O Furacão Ida provocou no início de setembro a maior chuva em 152 anos e deixou pelo menos 7 mortos no estado de Nova York e 2 em Nova Jersey. No entanto, a região do parque foi menos atingida - principalmente porque a terra absorve água, diferente do asfalto.

A existência de parques ou praças verdes em centros urbanos é, portanto, urgente para mitigar os efeitos das mudanças climáticas nesses espaços. O Rio de Janeiro é uma cidade que pode ser exemplo internacional porque temos o problema mapeado, e a solução está no meio da cidade - os maciços da Tijuca e da Pedra Branca. É urgente, portanto, a preservação das áreas verdes ainda existentes (por exemplo, impedindo a destruição de mata nativa e o avanço de construções sobre áreas de mangue e lagoas) e a restauração de áreas verdes destruídas, seja com a recuperação de espaços como parques e praças de bairro - um exemplo latente e atual é o Parque Realengo Verde, que pode ajudar a regular o microclima de uma das regiões mais quentes da cidade -, seja com o plantio de mudas nativas.

Os grandes centros urbanos são responsáveis por 70% das emissões globais de gases poluentes e sofrem com o fenômeno das "ilhas de calor". Portanto, no atual contexto climático do planeta, é urgente pensar em cidades menos poluentes (com o fortalecimento do transporte público e desincentivo ao transporte particular, reduzindo as emissões de CO2) e em cidades com áreas verdes, que contribuem para a melhora do microclima urbano e para a sociabilidade da população.