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Sandra Caselato

Comunicação Não Violenta também significa romper pontes

21/07/2020 04h00

Muitos instrutores de Comunicação Não Violenta (CNV), incluindo eu mesma, utilizam como analogia a ideia de pontes para falar sobre esta linha de conhecimento e prática. A CNV nos ajuda a criar, fortalecer e restaurar pontes nas relações com outras pessoas, onde essas conexões não existem, onde são fracas ou quando foram danificadas.

Quando as pontes estão fortes e bem cuidadas, as relações florescem, todos na família se sentem mais felizes, a produtividade no ambiente de trabalho aumenta, as amizades se fortalecem. Pontes fortes e estáveis suportam cargas mais pesadas com segurança e tranquilidade. Da mesma forma, quando nossas relações estão fortalecidas, fica mais fácil lidar com desentendimentos, desafios e conflitos.

Já facilitei processos de aprendizagem de CNV para mais de 7 mil pessoas, no Brasil e em outros países. Nesta trajetória, tenho escutado diversos relatos de como a Comunicação Não-Violenta vem apoiando pais e filhos a se conectarem; ambientes de trabalho a se tornarem mais colaborativos, com melhor qualidade de vida e motivação; líderes e funcionários a se entenderem de maneira mais eficiente; professores vêm conseguindo se aproximar dos estudantes, favorecendo um espaço com mais aprendizado e alegria; casais têm renovado suas relações; entre outras celebrações de melhoria nas relações.

Também tenho experimentando em meu próprio casamento, há mais de dez anos, como a CNV tem contribuído para fortalecer nosso relacionamento. Aprendemos a nos compreender melhor mutuamente e a lidar com nossas diferenças e conflitos de maneira a fortalecer a relação em vez de enfraquecê-la.

Além de sermos casados, trabalhamos juntos há dez anos, passando a maior parte de nosso tempo, no dia a dia, na presença um do outro. Mesmo acostumados com esta proximidade, a quarentena nos trouxe alguns desafios. Ambos nos sentimos mais ansiosos, tensos e irritados, no geral, devido às incertezas e perigos do momento de pandemia que vivemos e à redução das estratégias que costumávamos utilizar para lidar com o estresse do dia a dia. Sair de casa se tornou uma raridade, encontrar amigos e familiares, viajar e até mesmo a simples tranquilidade de não precisarmos nos preocupar em não contrair o vírus ou passar para outras pessoas, caso tenhamos.

Algumas famílias, não acostumadas a passar tanto tempo junto, têm sofrido ainda mais.

Desde o início da pandemia tenho ouvido relatos de muitas mulheres sobre as dificuldades e sobrecargas que têm enfrentado ao estar trabalhando a partir de casa, convivendo em tempo integral com filhos e marido. Falam como todos estão mais estressados e cansados, como se a família tivesse sido colocada dentro de uma panela de pressão, com os ânimos à flor da pele.

Também ouvi casos de violência doméstica e, pesquisando dados sobre o tema durante a pandemia, encontrei informações de que as notificações de casos aumentaram muito durante os primeiros meses e depois caíram, muito provavelmente devido à subnotificação por dificuldade em formalizar queixas e buscar auxílio, segundo especialistas.

Diante disso, a Câmara dos Deputados aprovou dia 9/7 um projeto de lei que estabelece medidas excepcionais para garantir às mulheres vítimas de violência o afastamento do agressor durante a pandemia.

Quando vejo esses casos de violência doméstica sinto muita angústia e me lembro do quanto é importante ressaltar que a Comunicação Não-Violenta também nos ajuda a decidir quando abandonar certas pontes em vez de tentar mais uma vez consertá-las.

Construir, fortalecer e restaurar pontes não são "mandamentos" da CNV, mas sim consequências possíveis de seu objetivo fundamental, que é cuidar do bem-estar e das necessidades de todos. Assim, romper uma ponte ou uma relação, pode ser em muitos casos a melhor estratégia para cuidar dos envolvidos, definitivamente ou temporariamente.

Para saber mais sobre Comunicação Não Violenta acesse www.sinergiacomunicativa.com.br