Brasil pode transformar crise do aço em oportunidade global sustentável
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A elevação das tarifas impostas pelos Estados Unidos sobre a importação de aço e alumínio afeta as exportações brasileiras e pode representar um novo choque para uma indústria já pressionada nos últimos anos, pelo menos no caso do aço, pelos pelos excedentes da produção siderúrgica chinesa.
Para seguir no jogo neste cenário e ir além de uma estratégia de reciprocidade ou de espera por acomodação, o Brasil poderia se reposicionar considerando diversificar e ampliar seus mercados compradores globais e, consequentemente, permitir elevação de investimentos e empregos no setor. Mas, se fosse fácil assim, já teria acontecido. No entanto, a falta crônica de competitividade da indústria brasileira, com algumas exceções, restringiu seu alcance ao mercado interno e a poucos parceiros globais.
Para começar um movimento no sentido de contornar essa realidade e se posicionar definitivamente no mapa de um mundo assolado pelas mudanças climáticas, o Brasil tem na natureza seu maior e mais potente diferencial de mercado: recursos energéticos renováveis abundantes e de altíssima qualidade, minérios, água, uma infraestrutura que inclui um setor financeiro robusto, universidades e centros de pesquisa bem estruturados, além de um sistema elétrico, portuário e rodoviário abrangente. Sem esquecer que o Brasil é reconhecido mundialmente pela diplomacia da paz.
Nesse reposicionamento, é fundamental que o país pise fundo na promoção comercial de sua produção industrial, que já é menos intensiva em emissões, e mapeie compradores globais com compromissos climáticos rigorosos. Além disso, deve explorar a estratégia de powershoring, ou seja, atrair investimentos com base na racionalidade econômica e climática de aproximar a produção dos recursos naturais. Dentre as oportunidades de novos parceiros comerciais, o desenvolvimento de uma colaboração mais estreita entre Brasil e Alemanha seria um exemplo relevante, como inclusive já tratamos em artigo recente aqui na coluna.
O aumento dos custos do gás natural na Europa tem afetado de maneira significativa a competitividade da indústria metalúrgica alemã, que também vem perdendo espaço para a da China. A produção de aço no país caiu 4% em 2023 e 8% em 2022, cenário que aumenta o risco de desindustrialização. Esse contexto pode levar empresas alemãs a transferirem parte de sua produção ou de suas cadeias de suprimento para outras regiões do mundo.
O Brasil seria destino interessante para novos investimentos (e empregos), uma vez que pode proporcionar tanto a desejada redução relativa de custos como o atendimento competitivo à regulação europeia de redução das emissões na produção. Acordos existentes, como a Parceria Brasil-Alemanha para uma Transição Justa, de 2023, poderiam alavancar essas exportações de produtos sustentáveis e estimular parcerias em termos de desenvolvimento tecnológico.
Evidentemente, colocar esse tipo de iniciativa em prática requer a superação de desafios expressivos. A ausência de um mecanismo claro para valorizar o atributo ambiental, as dificuldades na harmonização regulatória, a complexidade logística entre os países e o alto volume de investimentos necessários tornam essencial a atuação coordenada entre governos e uma política industrial bem estruturada. Sem isso, a indústria dificilmente terá condições de se engajar nesse processo.
Outro obstáculo é o Mecanismo de Ajuste de Carbono na Fronteira (CBAM) da União Europeia, que, assim como as tarifas de Trump, pode encarecer as exportações brasileiras, reduzindo sua competitividade. A superação desse obstáculo passa pela valorização dos predicados positivos do Brasil, que podem ajudar a atender às exigências desse mecanismo, inclusive atraindo investimentos europeus e asiáticos.
As decisões do novo governo dos EUA combinadas às condições desafiadoras do mercado internacional exigem empenho e criatividade dos países para buscar soluções viáveis que garantam a sobrevivência das indústrias, além de uma produção mais sustentável. Para o Brasil, parcerias com outros países podem ser alternativas vitoriosas nesta batalha.
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