Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Plataformas precisam ser muito mais duras com quem espalha fake news
Quando se fala em fake news, muita gente levanta a plaquinha "educação" como o antídoto ideal para encurtar as pernas da mentira. Parênteses: como jogam nas costas da educação a solução para todos os males, não é? Bem, sou um dos coordenadores de um curso online de educação midiática - se você não conhece, clique aqui, é bem bacaninha. Estamos no ar desde 2018, temos perfis grandes em redes sociais e já demos mais de 100 palestras presenciais e online. Nesse tempo, tenho construído uma convicção: iniciativas desse tipo ajudam, mas estão longe de resolverem, sozinhas, o problema.
Decepcionado? Por um tempo, eu também fiquei. Mas fui aprendendo que em educação é assim: o trabalho é de longo prazo, exige recorrência, consistência, formação de educadores e - algo que até agora a luta contra a desinformação não conseguiu - escala. Escala, também, é o desafio da checagem de fatos - quase nunca o desmentido tem o mesmo alcance da lorota. Lembrar desses fatores nos ajuda a balizar as expectativas. E a perguntar: que outras questões merecem atenção?
Os holofotes precisam se voltar para as plataformas. Aplicativos que operam com criptografia de ponta a ponta, como WhatsApp e Telegram, são opacos ao controle social da desinformação e se transformam em terreno fértil para a propagação da mentira. Mas mesmo as plataformas mais visíveis - Youtube, Facebook, Twitter, Instagram e TikTok, por exemplo - têm tido movimentações tímidas para impedir que usuários recorrentes no uso da desinformação sejam impedidos de seguir com a prática.
A bola da vez é o Twitter. A política da plataforma prevê exclusão permanente quando o usuário postar 5 ou mais informações falsas sobre a pandemia de covid-19. Na semana passada, o pastor Silas Malafaia teve 11 tuítes sobre o assunto suprimidos pelo serviço. Mas sua conta segue ativa.
Malafaia se defendeu com o argumento de sempre, o de uma suposta "liberdade de expressão" - "por mais esdrúxulo [sic] que seja à [sic] manifestação do pensamento", argumentou, em evidente ato falho. Trata-se de entendimento deturpado do que seria liberdade de expressão. Ela é um direito que precisa ser regulado sempre que ameaçar outros direitos - como o direito à vida, por exemplo.
Por mais que esteja velho dizer que "as mídias sociais são as novas arenas públicas da humanidade", o significado da frase não parece contemplado como deveria. Debates não são brigas campais, são atividades intelectuais que exigem regras. Não espalhar mentiras deliberadamente é uma das mais elementares.
Voltamos aos casos de figuras públicas que publicam fake news como e quando querem. Não são a senhorinha desavisada nem o tio conservador do Zap. Já sofreram sanções graduais como marcação e retiradas de postagens. Ou seja, já passaram por um processo, digamos, mais "pedagógico". Ainda assim, insistem na prática. Em nome de quê devemos tolerá-las?
É hora de bani-las. A exclusão dos perfis de Donald Trump após a invasão ao Capitólio é um exemplo virtuoso: segundo o "Washington Post", a divulgação de desinformação sobre fraude eleitoral caiu 73% nas semanas seguintes ao banimento das contas. É válido criticar que a decisão de impedir Trump de postar tenha partido de meia dúzia de bilionários do vale do silício. Voltamos à questão do caráter público das mídias sociais: é preciso trabalhar para uma regulação que estabeleça políticas editoriais claras, com a participação da sociedade civil em sua construção. É um trabalho de longo prazo que precisa ser construído. Por enquanto, tirar de cena quem envenena o debate já seria um bom começo.
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