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Rodrigo Hübner Mendes

Famílias e escolas: oportunidade para fortalecimento de vínculos

19/06/2020 04h00

Um dos aspectos mais desafiadores da atual pandemia é sua absurda abrangência. Ela é, de fato, onipresente. Isso assume uma condição crítica, quando nos vemos igualmente ameaçados mas desigualmente aparelhados para enfrentá-la.

Conversamos na semana passada com duas mulheres que são exemplos diversos de como lidar com as excepcionalidades destes tempos no âmbito da educação. Andrea Duque é diretora do Núcleo de Apoio à Saúde da Comunidade Escolar (NASCE), vinculada à secretaria de educação da cidade de Cruzeiro (SP). Luciane Fridschtein é servidora pública municipal na cidade de Manaus (AM), uma das áreas mais atingidas pela epidemia no Brasil. É mãe de David (8) e Arthur (4) e, durante a quarentena em sua cidade, tem trabalhado em casa.

Ambas têm experiências bem diferentes mas, de certa forma, complementares no enfrentamento cotidiano da crise. Como diretora de área na estrutura de educação de seu município, Andrea atende públicos heterogêneos: estudantes, familiares, professores e demais funcionários das escolas da sua cidade. Ao mesmo tempo, a desigualdade está à porta: enquanto há crianças cujas famílias conseguem manter contato à distância com a escola, utilizando internet e telefonia celular, outras não dispõem de recursos sequer para prover por completo sua alimentação. O desafio de Andrea e sua equipe é dar condições para que o maior número possível de escolas e de famílias consigam propiciar a seus alunos a continuidade de seu processo de aprendizagem, apesar das significativas restrições decorrentes do isolamento social. Isso significa desde a revisão de estratégias pedagógicas até o envio de cestas de alimentos.

Já Luciane vê o momento pelo lado da família. Mãe de dois meninos, o mais velho com deficiência, percebe a pandemia como um período de reinvenção da sua rotina. Até onde vai seu papel de mãe no apoio aos seus filhos na realização das atividades enviadas pela escola? Como perceber a fronteira entre o suporte construtivo e interferências que prejudicam a construção da autonomia? Ambas tiram de suas experiências tão diferentes uma importante conclusão comum: escola e família precisam ter um canal absolutamente aberto de comunicação. As famílias querem ser ouvidas. Não apenas para buscar amparo e solidariedade, mas também para contribuir com a experiência vivida. E as escolas precisam dessa interação para reafirmar ou corrigir rumos.

O que todos buscam é minimizar as perdas para o retorno à vida escolar. Mas já há o que celebrar ainda nesta transição. Famílias e escolas têm aprendido com a troca. Têm mesmo se conhecido melhor, interagido na distância. Um exemplo singelo, mas revelador: uma das escolas de Cruzeiro enviou, na cesta de alimentos enviada aos alunos assistidos, um maço de manjericão. Junto, uma diretora decidiu mandar a receita de um molho. Segundo as mães, a interação representada por aquele pequeno pedaço de papel mudou o dia e alegrou a mesa de diversas famílias.

A dimensão de uma descoberta, num momento de emergência para todos, está no quanto ela transforma a vida de alguém. Seja o sabor de um jantar conquistado, seja a renovação de uma relação familiar.