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OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

A pandemia mostra que filantropia brasileira precisa chegar nas favelas

O comunicador Raull Santiago formou um gabinete de crise para ajudar o Complexo do Alemão a enfrentar a pandemia - Wendy Andrade / Reprodução Instagram
O comunicador Raull Santiago formou um gabinete de crise para ajudar o Complexo do Alemão a enfrentar a pandemia Imagem: Wendy Andrade / Reprodução Instagram

Gelson Henrique, Marcelle Decothé e Raull Santiago

10/07/2022 06h00

Pensamos a filantropia como algo longe da realidade, mas ela está mais presente em nossa vida do que imaginamos. A pandemia, que não acabou ainda, é um momento chave para refletirmos sobre o assunto. Grande parte das iniciativas que trabalham o combate à fome de milhares de brasileiros são apoiadas por organizações filantrópicas.

Segundo o Censo GIFE foram mobilizados cerca de R$ 5,3 bilhões em 2020 para a sociedade civil, um resultado inédito para o setor e, certamente, um investimento sem precedentes em coletivos, organizações e movimentos que fazem trabalho na ponta. E que nesse período, importante ressaltar, vem desenvolvendo uma alta capacidade para gestão de recursos de grande porte. Mas, à medida que os impactos mais graves da pandemia se dissipam, investidores sociais privados sinalizam voltar aos antigos padrões de doação.

As organizações filantrópicas e de investimento social privado precisam se repensar urgentemente, construindo estratégias e políticas para que mais dinheiro seja aplicado nas iniciativas. Só assim, verdadeiramente, elas poderão impactar a realidade das pessoas que mais sofrem com as desigualdades no país e construir uma transformação real.

Pensando nisso, construímos a PIPA, para ajudar a democratizar o acesso ao investimento social privado no Brasil. Uma ponte entre financiadores e coletivos, movimentos e organizações de base favelada e periférica que atuam para reduzir desigualdades sociais e no combate ao racismo estrutural. Nessa carta aberta é possível saber mais.

Fizemos uma pesquisa preliminar em 2021 que apontou 90% das organizações de base favelada e periférica com barreiras para acessar financiamento. Na prática, isso quer dizer menos trabalho social nas ruas. Um terço delas gera menos de R$ 5 mil por ano. No mesmo levantamento, 54% declararam que funcionam com fundos próprios da equipe. Ou seja, tiram dinheiro do bolso. Os dados escancaram a importância e a urgência de se aumentar os apoios.

Já fizemos muito, não vamos esperar as condições perfeitas para começar a agir. Mas queremos e podemos mais. Sabemos o que acontece quando o dinheiro chega e fazemos junto. Quando isso acontece. Por isso, queremos incentivar a democratização dos recursos, conectando a filantropia às favelas e periferias do Brasil.

Gelson Henrique: Sociólogo, mestrando em Políticas Públicas e Formação Humana (PPFH/UERJ). Coordenador Executivo da Iniciativa PIPA.

Marcelle Decothé: Doutoranda em sociologia pela UFF. Atua como Gestora de Programas no Instituto Marielle Franco.

Raull Santiago: Cria do Complexo do Alemão e um dos 50 profissionais mais criativos do Brasil pela revista WIRED (2020).