Topo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Do ônibus à comida que comemos, como a COP26 afeta nossas vidas

Trólebus em São Paulo - Alffoto/iStock
Trólebus em São Paulo Imagem: Alffoto/iStock
Danilo Farias e Luciano Frontelle

03/11/2021 06h00

Enquanto muitas cidades no Brasil sofrem com a falta de abastecimento de água, aqui na Escócia as pessoas que queriam vir de trem para Glasgow precisaram esperar ou usar outros meios de transporte devido ao excesso de chuvas. Extremos climáticos são eventos que cientistas e a mídia em geral expõem há algum tempo e é justamente para evitar que isso continue piorando que líderes de países, ativistas, jornalistas e empresários se reúnem na COP 26 — a conferência da ONU sobre mudanças climáticas.

Mas, apesar de não parecer, o que se discute aqui ou foi discutido em outras COPs no passado afetam nossas vidas diretamente de várias formas.

Vejam, diariamente milhares de brasileiros usam o transporte público para se deslocarem para o trabalho. Essa é uma das maiores contribuições de gases de efeito estufa nas cidades e é justamente por isso que, por exemplo, a cidade de São Paulo conta com a maior frota de ônibus elétricos do Brasil. Esse tipo de política é resultado direto das discussões que acontecem na conferência sobre clima.

No entanto, as conferências não têm resultados apenas para grandes cidades. Por intermédio das negociações do acordo climático, projetos locais do mundo todo conseguem realizar seus objetivos.

Muitos territórios marinhos protegidos foram beneficiados a partir do apoio a projetos socioambientais com foco em empreendimentos solidários e cadeias produtivas sustentáveis. O turismo de base comunitária e a capacitação e formação de lideranças para gestão participativa de unidades de conservação marinhas impactaram positivamente a vida de pescadores, catadores de caranguejo, marisqueiras, extrativistas e pessoas que indiretamente estão associadas ao uso sustentável de recursos naturais.

No Brasil, por exemplo, as reservas extrativistas do Sul da Bahia, tais como Cassurubá, Corumbau e Canavieiras e o Parque Nacional Marinho de Abrolhos, foram contempladas com recursos do Global Environment Facility, um dos mecanismos de financiamento apoiados a partir das negociações.

Em relação às diversas pessoas que direta ou indiretamente dependem das florestas, podemos destacar REDD+, as iniciativas de pagamento por serviços ambientais, os percentuais financeiros de repartição de benefícios, e a destinação de investimentos para os Fundos Clima e Amazônia, instrumentos que nasceram das conferências e continuam sendo aprimorados. Todas essas iniciativas de modo geral têm impacto socioambiental a partir da criação de empregos que existam em harmonia com a natureza e com a preservação dos modos de vida e costumes dos povos indígenas e comunidades tradicionais.

Podemos dizer que, por mais que essas discussões pareçam (e muitas vezes sejam) distantes da realidade da maioria das pessoas, ativistas e governos de cidades e estados marcam presença para cobrar ação e apresentar boas práticas sobre o que têm feito localmente para enfrentar a crise climática. O que demonstra a importância de escolhermos representantes que se preocupem de fato com nosso bem-estar e busquem todos os recursos possíveis para que os lugares onde vivemos estejam preparados para os desafios impostos pela crise climática.

E na próxima vez que alguém perguntar sobre qual a importância da agenda de clima na sua vida, lembre-se de que é dessas discussões que surgem muitos dos incentivos e políticas para que:

  • A comida que chega na sua mesa seja produzida por uma agricultura que possa produzir mais, ocupando menos espaço e poluindo menos;
  • A roupa que vestimos seja produzida por pessoas em condições de trabalho dignas e sustentáveis;
  • A conta de luz fique mais barata a partir da criação de novos empregos nas áreas de energia limpa e renovável, como solar e eólica;
  • O ar que nós respiramos seja de qualidade, evitando que milhares de pessoas tenham problemas respiratórios ou até acabem morrendo devido à poluição, especialmente nas cidades;
  • Famílias que tenham perdido seus territórios devido às consequências climáticas que já estamos vivendo -- como o que aconteceu na enseada da Baleia, São Paulo -- tenham amparo multissetorial. (Esse ponto ainda é polêmico e será discutido aqui em Glasgow a partir dos Artigos 7 e 8 do Acordo de Paris, que falam sobre mecanismos de adaptação e de perdas e danos, respectivamente).