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Noah Scheffel

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Quais mães homenageamos?

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Imagem: iStock

09/05/2022 06h00

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O Dia das Mães é uma data comercial. Mas ok, vivemos em uma sociedade capitalista que possui rituais herdados de civilizações colonizadoras. Eu poderia vir aqui e problematizar esta data e propor, como tantos movimentos vêm tentando, decolonizar a nossa sociedade principalmente para os grupos que não se sentem representados, e nem são, neste sistema historicamente hegemônico, cheio de vieses preconceituosos, e com preocupações seletivas que reforçam desigualdades e extinguem existências.

Mas dadas as circunstâncias, eu, sendo mãe mesmo sendo homem, vivendo nesta sociedade que descrevi, acho necessário colocar o holofote apontado para esta data para além do clichê que diz que "dia das mães é todo dia do ano", e repensar de que mães estamos falando quando chegamos neste dia, e de que mães estamos falando o ano inteiro.

Sendo a data comercial, é inevitável propagandas e campanhas de marcas e empresas fomentando este dia para o consumo e o reconhecimento "do que elas merecem" em forma de presentes. Porém, você já se perguntou onde estão mães que são pessoas com deficiência nas campanhas que assistiu Ou mães mulheres trans? Ou até mesmo que tipo de representação estão sendo vinculadas às mães negras nestas campanhas? Sem falar das mães que adotam, das mães que são homens trans e desempenham essa função e das mães indígenas.

Existe uma pluralidade muito grande no conceito de maternar que ainda continua invisibilizada. E o problema não é que a invisibilização acontece apenas nos comerciais de TV nesta época do ano. O problema é que essa invisibilização ocorre o ano inteiro para essa pluralidade de maternagem em outros aspectos de suas vidas, gerando violência de diferentes níveis e tipos para essas pessoas.

Posso trazer como exemplo as empresas que se vangloriam por contratar mães grávidas, e quando vamos ver, são mulheres cis brancas. Ou pior, o outro lado que sãi as mães demitidas após licença maternidade e, neste caso, mulheres cis negras. Os movimentos por direitos infelizmente ainda não compreendem os mesmos acessos quando a maternidade é exercida por mulheres negras, por pessoas trans, por pessoas com deficiência e tantas outras formas de ser mãe.

A pressão que as empresas sofrem hoje para que não perguntem na entrevista de emprego se a mulher possui filhos ainda é uma realidade apenas quando essa mulher é uma mulher cisgênero, branca, sem deficiência. Ainda poucas empresas adotaram licenças maternidade equânimes para mães que não gestaram seus próprios filhos. Chegar a falar em diferentes formas de parentalidade então ainda é de uma perspectiva muito distante.

Ou seja, mesmo com toda essa pluralidade no maternar, assim como o sistema hegemônico colonial que há anos ensinou quem deveria ser valorizado, continuamos reproduzindo de diferentes formas e em diferentes espaços a mesma exclusão de diferentes vivências.

Que mães homenageamos neste Dia das Mães e como elas foram retratadas? Que estereótipos reforçamos quando homenageamos mães negras? Onde colocamos mães trans? Por que não nos indignamos com o que está acontecendo com mães indígenas?

Mães negras estão muito mais sujeitas a sofrerem violência obstétrica. Homens trans grávidos têm atendimento médico e pré-natal negado. Mães que são mulheres trans e travestis têm a impossibilidade de registrar seus filhos.

Se lutamos para que o dia das mães seja o ano todo, já passou da hora de incluirmos todas as diversidades de mães nessa mesma luta.