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Noah Scheffel

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Metaverso em processos seletivos. Bom ou ruim?

Ambiente de trabalho virtual no metaverso do Meta Quest 2 - Divulgação/Meta
Ambiente de trabalho virtual no metaverso do Meta Quest 2 Imagem: Divulgação/Meta

18/04/2022 06h00

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Nem todas as pessoas compreenderam do que se trata o tal metaverso e já tem grandes empresas realizando etapas e processos seletivos para contratações que utilizem essa "realidade paralela". Óbvio que uma manchete de uma empresa sendo tão disruptiva a este ponto faz a concorrência tremer, afinal, continuamos chovendo no molhado na distopia do recorde de desemprego versus a quantidade de vagas em aberto no mercado.

Poderíamos estar dando importância em entender como fazer essa matemática fechar, mas estamos aqui aplaudindo mais uma "inovação". Mas aí, quando a gente estuda sobre inovação, a gente começa a problematizar essa quantidade de coisas sem propósito pintadas como inovadoras, quando de fato não resolvem problemas ou melhoram processo nenhum. Então, antes de falar sobre processos seletivos e sobre a adoção destas etapas, a primeira coisa que eu preciso dizer é que talvez nada disso seja inovador, e sim apenas mais um mecanismo para a empresa aumentar seu fã clube e fortalecer como a marca é vista pelas pessoas. Do que pude ver daqui, tem funcionado. Ao menos para ganhar as primeiras páginas dos portais de recursos humanos e as pautas repetitivas no LinkedIn.

Ok, talvez eu tenha começado já te deixando com a impressão de que, na minha opinião, esses processos são ruins porque na minha ótica ainda temos problemas maiores com relação a processos seletivos, como a inclusão de recortes ainda minorizados dentro das empresas. Mas do que posso observar, é exatamente aqui que as dores se cruzam.

Vemos como desafio tanto contratar e manter talentos engajados, quanto focar nos recortes que ainda são minoria neste mesmo ambiente. E esses dias refletindo sobre essa nova onda eu percebi um poder muito grande dos processos seletivos no metaverso - e, como dizem lá no universo paralelo da Marvel, "com grandes poderes vêm grandes responsabilidades". Mas segue aqui que eu te conto o link que eu fiz entre essas dores e a oportunidades de "inovação" em unir metaverso com processo seletivo.

Chegamos a um momento de mercado em que as pessoas estão sendo muito disputadas pelas organizações, seja por suas qualificações ou por seus marcadores sociais (se for o pacote completo então, melhor ainda). E neste cenário, muitas pessoas de recortes de diversidade subrepresentados têm se preocupado com o local onde, finalmente, têm a oportunidade de escolher trabalhar. A marca empregadora até consegue passar determinadas imagens para o mercado, mas quando a gente faz parte de um destes recortes, já no processo seletivo é possível percebemos como a empresa de fato é em relação à temática da diversidade: seja quando a pessoa entrevistadora não sabe se apresentar usando pronomes e se perde quando questionada, seja passando por várias etapas com diferentes pessoas que são todas brancas - para citar alguns exemplos. Estes são momentos em que a empresa perde o interesse daquele talento na vaga.

Agora imagina poder estruturar um processo seletivo que reúne tanto o ambiente quanto as pessoas ideais para atender o que cada pessoa candidata espera encontrar, ainda que virtualmente. Imagina você sendo uma pessoa com deficiência sendo entrevistada por uma pessoa recrutadora que te recepciona utilizando uma cadeira de rodas. Imagina uma banca avaliadora de dinâmica em grupo onde existem pessoas de diferentes raças, diferentes gêneros, diferentes expressões. O metaverso em processos seletivos possibilita que as empresas demonstrem uma representatividade de diversidade que provavelmente elas não têm. Até porque os avatares virtuais podem ser criados justamente para suprir essa lacuna que a organização possui, sem demonstrar quem são as pessoas que de fato estão avaliando cada etapa. Por trás de um "bonequinho" que te representa, pode existir uma pessoa que carrega os mesmos vieses que uma pessoa que não te representa, porque o avatar não é real.

Por outro lado, para a pessoa candidata, esse reconhecimento de se ver em quem a entrevista é, no mínimo, acolhedor. Quem trabalha com diversidade em processos seletivos sabe que as pessoas candidatas se saem muito melhor nas entrevistas quando se sentem representadas por quem as está avaliando. Isso significa que aquela identificação já as faz se sentirem pertencentes ao momento, mais seguras de si, e possibilita que consigam ser elas mesmas sem medo de julgamentos. Isso acontece pois entendemos que existe ali alguém que vai compreender tudo que trouxermos a partir do nosso local de fala. Ou seja, por esta ótica, as pessoas de recortes minorizados no mercado de trabalho possuem mais chance de avançar nas etapas e receber uma boa proposta de trabalho.

Se é bom ou ruim, a gente vai descobrir à medida que as empresas forem adotando tais processos e demonstrando qual de fato é a intencionalidade de tal poder, e pelo que elas estão sendo responsáveis. Para mim, se este for um caminho em que a gente consiga fechar aquela conta matemática que o resultado não bate, eu estou pronto para criar meu avatar e fazer parte dessa alternativa virtual em prol da empregabilidade com foco na inclusão e na diversidade.

O que não dá pra esquecer nunca é que a vida real é a prioridade, e se a inovação for só pra fugir da realidade, a gente não está resolvendo problema nenhum e está embarcando em mais um espaço de desigualdade.