Topo

M.M. Izidoro

Não há mais tempo de termos esperança

13/06/2020 04h00

Todos concordamos que esses últimos meses não foram fáceis.

Entre pandemias mundiais e crises econômicas que vão impactar uma geração inteira, está difícil acharmos coisas que nos façam se sentir bem.

Esse eterno estado de incerteza não é saudável para ninguém. Mas como sair desse ciclo vicioso quando nada parece estar bem?

Por causa das coisas que escrevo aqui na coluna - e pelo meu estilo de vida - muitas pessoas me pedem ajuda. Alguns com situações pessoais, outros com questões mais macro.

Mas no fundo de cada pergunta e interação que tendo, tem a mesma pergunta. Uma pergunta milenar que chuto que todos os humanos que já existiram já se perguntaram pelo menos uma vez na vida:

"Vai ficar tudo bem?"

Essa é uma pergunta muito simples que, como em toda simplicidade, tem um mundo de complexidade nela.

Na semana que começaram os protestos dos movimentos raciais aqui e nos Estados Unidos, eu conversei com muita gente. Mediei um debate incrível aqui no UOL, dei entrevista para TV, conversei com muitos amigos, gestores de empresas, líderes comunitários, enfim, foi uma semana longa. Todos os papos tinham as mesmas preocupações e um senso de urgência nelas.

As pessoas queriam entender o que elas podiam fazer para ajudar a acabar a opressão racial contra os negros. O que elas podiam postar. Para onde elas podiam doar. Com quem elas podiam falar. Mas, no fundo, era tudo muito macro, tudo muito grande. Tudo no sentimento de esperança do que eu posso fazer para "ficar tudo bem"?

"Você não pode fazer nada para mudar o mundo, mas você tem de fazer tudo que pode para mudar você." Foi em resumo a minha resposta para todos eles.

Não era o que muito queriam ouvir, mas como diria o filósofo Jagger, "você nem sempre consegue o que você quer, mas se você tentar, você pode conseguir o que você precisa."

Estamos em uma época em que a reação é muito maior do que as ações que fazemos sobre os acontecimentos. Por causa das redes sociais, ciclo de notícias e a narrativa que estamos vivendo, a gente está sem tempo de planejar e de agir de fato. A moeda principal é a reação instantânea. Seja para receber like em um foto ou post, ter milhões de compartilhamentos ou fazer parte de um movimento com hashtag e quadradinho colorido no feed. Ficar puto com o que um político ou um famoso disse e fez. Com uma situação de opressão e gritar nas redes sociais ou nos grupos de mensagens contra isso é a bola da vez. Isso faz a gente se sentir bem, mas não é o que vai mudar o mundo e nem o que vai mudar você.

O que a gente precisa agora é de ações reais, efetivas e rápidas. Coisas grandes levam tempo e precisam de muita energia para acontecer, mas coisas pequenas a gente consegue muda-las várias vezes e de vários jeitos até acharmos o jeito que funciona para a maioria das pessoas.

Então, fazer coisas que estão ao nosso alcance agora, é talvez mais importante do que pensar em uma ação global com milhões de pessoas. Pois ao mudarmos a gente, a gente muda como vemos o mundo e assim o mundo muda com a gente.

Então, se você está preocupado com a causa negra, quais são as ações que você pode fazer na sua casa, bairro, empresa para proteger e enaltecer pessoas pretas? É contratar mais gente? É sentar e conversar? É tentar ouvir, entender e respeitar o que eles estão falando e pedindo? Não é só fazer caridade e postar hashtag que vai mudar o mundo, mas é fazer uma ação que pode mudar a sua vida e a da outra pessoa para o resto de suas vidas.

Isso também funciona para a causa LGBTQ+, indígena e principalmente às nossas causas individuais. A gente quer mudar o mundo, mas não quer mudar a gente. Mudar como a gente age, o que a gente come, as expressões que a gente fala. E de verdade, é só fazendo essas pequenas ações no nosso dia a dia que podemos ajudar com que muitas outras pessoas não sofram e tudo finalmente "ficar bem". Até a hora que alguém reclame que não está e começamos o ciclo tudo de novo.

Em cada ação dessa mora um potencial gigante de esperança em um mundo e sociedade melhor. Mas esperança é um sentimento muito traiçoeiro, pois ele pode nos deixar parados no mundo das ideias e nos tirar do mundo da ação. Mas se cada um fizer um pouquinho, o que era só um sentimento toma corpo. O nosso corpo.

Parece que o mundo está acabando, mas ele só está mudando. E ainda temos tempo de guiar ele para uma mudança mais justa e igualitária para todo mundo. Essa mudança não está do lado de fora, ela está dentro da gente.

Não há mais tempo de termos esperança, por que hoje é o tempo de sermos ela.