Florestas de bolso: "ilhas verdes" que ajudam a resfriar as cidades
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Um mantra que poderia ficar estampado na porta da sua geladeira: floresta em pé é bom sempre. Não importa o tamanho nem o lugar. Podem ser milhares de hectares de árvores centenárias cravadas no coração da Amazônia, ou apenas 15 metros de pequenas mudas na esquina de casa que, em breve, crescerão e se tornarão uma ilha de resfriamento no caos de calor urbano. Toda floresta tem sua importância.
Para quem mora nas cidades e que vivencia um clima baseado em poluição e aquecimento crescente, pequenos oásis verdes são um alívio. O botânico Ricardo Cardim cunhou o termo "Florestas de Bolso" para uma técnica natural de restauração ecológica da Mata Atlântica que ele desenvolve desde 2011. Cardim vem usando sua expertise para reflorestar pequenas áreas urbanas com espécies nativas e o resultado são o resfriamento e a umidificação do ar - pois a vegetação absorve (muita) água dos lençóis freáticos, lançando-a para a atmosfera, o que traz uma sensação de frescor.
E as micro florestas trazem outros benefícios no pacote: diminuem o barulho, a poeira, reciclam gases tóxicos, abrigam aves que combaterão pragas urbanas, como mosquitos transmissores de doenças, diminuem enchentes, uma vez que a copa das árvores funciona como uma esponja, que segura a água da chuva e, lentamente, a encaminha para o lençol. Como diz Cardim, é uma máquina de saúde para as cidades e seus moradores.
"A Floresta de Bolso é uma das ferramentas que a gente tem para atuar em dois tipos tipos de mudanças climáticas: a global e a local, esta última causada pela péssima urbanização das cidades brasileiras, que hoje mal conseguem tirar o cimento de baixo de suas árvores. Via de regra a natureza nunca foi importante na construção das cidades. Por isso que a Floresta de Bolso é quase uma instalação artística, eu brinco, porque ela gera uma provocação tanto nas pessoas como no poder público. Afinal, aprendemos, desde sempre, que a natureza nativa não poderia conviver com as cidades. Que ela pertence ao mundo das feras, das doenças, das cobras, dos maus espíritos. Isso vem desde a época dos portugueses", comenta Cardim.
A primeira Floresta de Bolso pública plantada em um mutirão voluntário foi na Vila Olímpia, bairro da capital paulista, em 2016, em uma praça onde ficava a margem do córrego Uberabinha, hoje canalizado. Hoje são 18 florestas no total, espalhadas entre São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Entre estas áreas estão os 5 mil metros do Parque Olímpico do Rio de Janeiro, que tinha se tornado um depósito de lixo e entulho, e hoje foi reflorestado.
As espécies plantadas são nativas e minuciosamente estudadas por Cardim - incluindo as distâncias e a convivência entre elas: uma árvore a cada metro quadrado, com uma composição de espécies variando de acordo com a ciência de restauração da Mata Atlântica. "O Brasil detém a maior biodiversidade do mundo e a maior quantidade de espécies nativas do planeta. Mesmo assim, 90% da vegetação plantada nas ocupações humanas é de origem estrangeira: nossos jardins vêm de fora. Queremos trazer esta natureza brasileira de volta".
Segundo o botânico, em um ano, as árvores das Florestas de Bolso alcançam três metros. Em dois anos seis, e, em três anos, oito - todas plantadas em lugares inóspitos e sem a necessidade de manutenção ou irrigação. "A natureza é assim: se a gente abandona uma área que tem floresta em volta, com sementes, ela volta a crescer sozinha", explica.
Cardim completa chamando a atenção para a necessidade urgente do poder público abraçar soluções como esta, uma vez que as cidades estão em estado de emergência - e não existe saída mágica.
"Se as cidades brasileiras tivessem a Floresta de Bolso como política pública, embasada em ciência, de forma pulverizada em suas malhas urbanas, certamente seriam muito mais resilientes às mudanças climáticas e eventos extremos, além de proporcionar mais saúde física e psicológica à população".
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