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Mari Rodrigues

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

A vida de uma batalhadora e um ensaio sobre a diferença

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Imagem: iStock

28/08/2021 06h00

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Esta semana cometi uma loucura: fui ao show de uma cantora que admiro bastante. A apresentação foi incrível, e como ainda tinha um tempo antes de tomar meu rumo, fui tomar uma cerveja para apartar ao calor que fazia naquele lugar. Parei em um canto que não tinha aglomeração (como temos visto ultimamente) e comecei a conversar com a garçonete. Vou chamá-la de Joana.

Em pouco tempo, Joana foi com a minha cara e começou a contar a história de sua vida: da infância sofrida no roçado no interior do Ceará até a mudança para a cidade grande, vivendo no morro e batalhando junto com o marido para cuidar de suas duas filhas. Sempre alguém as acompanha até a escola, sempre acompanham a vida delas para que não se envolvam com más companhias. O maior medo de Joana é que sua filha mais velha, adolescente, engravide ainda nessa fase da vida.

Ouvia atentamente ao seu relato e ao mesmo tempo pensava em tantas outras pessoas que fizeram este mesmo trajeto de sair de suas vidas no Norte e no Nordeste, situação pela qual eu mesma passei, para tentar a vida no Sul e no Sudeste. As oportunidades de ganho de vida ainda não chegaram nessas regiões, mesmo depois de tantos anos.

E uma vez na grande cidade, muitas pessoas, sem condições, são relegadas a viver nas periferias, com pouca ou nenhuma condição sanitária. E a sofrer preconceitos por ser de origem desses lugares menos desenvolvidos do país, e pobre, e de cor. Lembro de quando as pessoas me perguntavam de coisas absurdas; às vezes me enfurecia, mas com o tempo, fui entrando na brincadeira e respondendo que, sim, andava de onça e cipó. Você ressignifica a onça e o cipó. São símbolos de sua identidade diferente.

Diferença. Talvez essa seja a palavra que defina a relação entre as pessoas do Sul e do Norte (pontos esses em sentido amplo). Da inocência dos interiores à malícia das metrópoles; da batalha pela sobrevivência no roçado ao medo de gravidezes indesejadas no morro; tudo isso é sintomático de uma contradição que ainda existe entre a riqueza do centro da cidade grande e o padecimento da periferia.

Sempre falo aqui que entender as diferenças é um passo para um mundo melhor. E uma boa convivência entre as pessoas passa por reconhecer essas peculiaridades e formar um círculo virtuoso.