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Mara Gama

Um lupa na lata de lixo do Brasil

Menino pobre cata lixo no lixão - iStock
Menino pobre cata lixo no lixão Imagem: iStock

Colunista do UOL

24/12/2020 04h00

Não. Não é só nas festas de fim de ano que o desperdício de comida e a montanha de embalagens são gigantes. Cada brasileiro descarta 170 quilos de matéria orgânica por ano. E na lata de lixo do Brasil tem cada vez mais plástico. Os dados estão na última edição do Panorama dos Resíduos Sólidos, levantamento feito pela Abrelpe (Associação Brasileiras das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais), um dos raros estudos com atualização periódica sobre o setor.

Nos últimos dez anos, aumentou o descarte de recicláveis; agora são 35%. Esse número se divide entre plásticos (16,8%), papel e papelão (10,4%), vidros (2,7%), metais (2,3%) e embalagens multicamadas (1,4%). O material orgânico, embora ainda seja preponderante, diminuiu, e hoje é 45,3% do total, mais de 36 milhões toneladas por ano.

Os rejeitos, que são a parte não passível de reciclagem no momento (por falta de tecnologia, logística ou investimento ou tudo isso ao mesmo tempo) correspondem a 14,1% do total, e são compostos principalmente de materiais sanitários. Resíduos têxteis, couros e borrachas somam 5,6%, e outros resíduos não discriminados são 1,4%.

Apesar de ter aumentado o número de cidades com iniciativa de coleta seletiva (eram 56,6% dos municípios em 2010 e agora são 73% das cidades que têm algum tipo de ação), há um apagão de dados sobre a reciclagem dos materiais. Segundo a Abrelpe, as informações vêm das entidades industriais de cada setor e não vêm sendo atualizadas.

O tamanho da lata de lixo do país também aumentou. O Brasil está produzindo 19% mais resíduos que em 2010, passando 67 milhões toneladas por ano para 79,6 milhões toneladas/ano em uma década. Desse total, os plásticos somam 13 milhões de toneladas anuais.

O problema não está apenas no aumento da geração. O estudo aponta aumento da quantidade de resíduos enviados a lixões e locais que não apresentam todos os controles ambientais necessários. O total passou de 25 milhões de toneladas por ano em 2010 para mais 29 milhões de toneladas por ano após uma década.

Esse volume de lixo em locais inadequados afeta as populações de seus entornos, poluindo ar, água e solo, além, evidentemente, de causar danos à saúde aos que trabalham diretamente na catação ali. A Abrelpe estima que haja impacto na saúde de 77,65 milhões de pessoas, com custo ambiental e para tratamento de saúde de cerca de US$ 1 bilhão por ano.

LIXÕES
As regiões Centro-Oeste, Nordeste e Norte têm índices mais altos da chamada destinação inadequada de resíduos. Na região Norte, 79% das cidades (357 municípios) encaminham para lixões ou locais que não têm todos os controles ambientais. Na região Nordeste, 1.340 cidades (74,6%), e no Centro-Oeste, 305 cidades (65%) enviam para áreas não preparadas corretamente.

Além do lixo enviado aos lixões, com gastos de coleta e transporte, há o lixo que é dispersado diretamente no meio ambiente, de forma pulverizada. A estimativa é que sejam 6,3 milhões de toneladas por ano. São os 8% da geração total que não são coletados na coleta regular. Segundo o presidente da Abrelpe, Carlos Silva Filho, nesse ritmo de evolução, serão necessários 55 anos para que aterros controlados e lixões sejam encerrados em todo o país.

EFEITO ESTUFA
O setor de resíduos foi responsável por 4% das emissões de gases do efeito estufa no país em 2019, ou 96 milhões de toneladas de CO2 equivalente emitidas. Em relação a 2010, houve aumento de 23% nas emissões.

O estudo aponta que é pequena a parcela de aterros sanitários que tem sistema de aproveitamento do biogás: apenas 49. Esses sistemas diminuiriam as emissões, assim como a compostagem dos orgânicos de forma descentralizada.