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Fred Di Giacomo

REPORTAGEM

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Quem é Manoel de Barros; poeta da novela Pantanal que amava a natureza?

Na novela "Pantanal", Juma (Alanis Guillen) ganha livro do poeta Manoel de Barros de Jove (Jesuita Barbosa)  - Estevem Avellar/Divulgação
Na novela 'Pantanal', Juma (Alanis Guillen) ganha livro do poeta Manoel de Barros de Jove (Jesuita Barbosa) Imagem: Estevem Avellar/Divulgação

12/07/2022 04h00

Quem acompanha a novela 'Pantanal', na rede Globo, tem tido a oportunidade de conhecer um pouco da cultura pantaneira. Em um dos últimos episódios da trama, assistimos Juma (Alanis Guillen) receber Jove (Jesuita Barbosa) em sua tapera. A 'mulher-onça' havia organizado a casa para receber o herdeiro de Zé Leôncio, que lhe presenteou com o 'Livro de Pré-Coisas' para que Juma pudesse aprender a ler. Na cena Jove diz: "Ninguém melhor que ele para continuar te ensinando (a ler e a escrever)". O livro, em questão, é um clássico de um dos maiores poetas da língua portuguesa: Manoel de Barros (1916 -- 2014).

A história de Barros está entrelaçada com a da novela, criada originalmente por Benedito Ruy Barbosa. A primeira versão de 'Pantanal', exibida na rede Manchete nos anos 1990, contava em seu elenco com a atriz Cássia Kiss que descobriu a obra de Barros gravando a novela, se tornou amiga do poeta e, anos depois, estrelou um monólogo inspirado em seus versos chamado 'Meu Quintal é Maior Do Que o Mundo'.

Em março de 2022, para divulgar a remake da novela, a rede Globo lançou, nas redes sociais, a série 'O elenco de Pantanal recita Manoel de Barros', na qual Alanis Guillen e Jesuita Barbosa apresentam ao público os versos do autor.

Mas quem é Manoel de Barros?

Manoel de Barros - Marlene Bergamo/Folhapress - Marlene Bergamo/Folhapress
O poeta mato-grossense Manoel de Barros morreu, aos 97 anos, em 2014
Imagem: Marlene Bergamo/Folhapress

Manoel Wenceslau Leite de Barros nasceu em Cuiabá, Mato Grosso, mas passou grande parte da sua vida criando gado no Mato Grosso do Sul, tal qual um Zé Leôncio. Com um ano, o poeta se mudou com a família para uma fazenda em Corumbá (MS) e, com 10 anos, foi , sozinho, para Campo Grande (MS) para completar os estudos.

Barros, viveu alguns anos no Rio de Janeiro, onde se formou em direito, e foi militante comunista na juventude. Desiludido com os rumos do partido, passou alguns anos viajando pelo exterior até que se fixou, novamente, no Mato Grosso do Sul onde se dedicou a criar gado escrever poemas e amar a natureza, sobre a qual escreveu que "é uma força que inunda como os desertos." Muitos de seus poemas têm, como personagens centrais, a flora e a fauna e, como cenário, o Pantanal e suas belezas naturais.

Manoel de Barros escreveu poemas a vida toda, mas ficou mais conhecido nos anos 1980, quando foi "descoberto" e divulgado por Millôr Fernandes. Em 1985, publicou 'Livro de Pré-Coisas', ambientado em uma viagem pelo Pantanal, e que foi escolhido para aparecer na novela de mesmo nome. Em 1987, ganhou o Prêmio Jabuti, o mais importante da literatura brasileira, com o livro 'O guardador de águas'.

Borboletas
"Borboletas me convidaram a elas.
O privilégio insetal de ser uma borboleta me atraiu.
Por certo eu iria ter uma visão diferente dos homens e das coisas.
Eu imaginava que o mundo visto de uma borboleta seria, com certeza,
um mundo livre aos poemas.
Daquele ponto de vista:
Vi que as árvores são mais competentes em auroras do que os homens.
Vi que as tardes são mais aproveitadas pelas garças do que pelos homens.
Vi que as águas têm mais qualidade para a paz do que os homens.
Vi que as andorinhas sabem mais das chuvas do que os cientistas.
Poderia narrar muitas coisas ainda que pude ver do ponto de vista de uma borboleta.
Ali até o meu fascínio era azul."
(Manoel de Barros, em "Ensaios fotográficos", Rio de Janeiro: Record, 2000.)

Filme conta vida verdadeira (e as vidas inventadas) de Manoel de Barros

Em 2010, o cineasta Pedro Cezar dirigiu o documentário 'Só dez por cento é mentira' sobre a vida, a obra e as memórias inventadas de Manoel de Barros. O filme é baseado em uma frase famosa de Barros que dizia: "Noventa por cento do que eu escrevo é invenção. Só dez por cento é mentira". Entre suas obras mais famosas encontra-se, inclusive, a trilogia de poemas em prosa 'Memórias inventadas', lançada entre 2003 e 2008, em três volumes, e relançada, postumamente, em um único livro pela editora Alfaguara.

Manoel de Barros faleceu em 2014, aos 97 anos, em Campo Grande consagrado como um dos maiores poetas do Brasil e como a voz mais famosa a cantar as belezas do Pantanal.

Dá para assistir o filme 'Só dez por cento é mentira' online aqui: