É violento viver sabendo que posso levar uma voadora apenas por existir
Ao ler a notícia escrita pelo repórter Demetrio Vecchioli sobre o caso do lutador negro que levou uma voadora estar abraçado a uma mulher branca, não há como não temer. Mas é um medo diferente, confesso, mesmo sendo negro e tendo, em grande maioria, relações com pessoas não negras - ou seja, brancos.
Meu receio é não ter quem se coloque de frente, sobre quem se diz ''aliado''. Sobre não saber como controlar a ação do outro e, talvez, piorar a retaliação a mim. Afinal de contas, é esperado que, de um corpo negro, saiam ações violentas e de rispidez. Agora: e de um corpo branco? O que esperam? Só a passabilidade de serem, em muitos casos, imunes a receber uma agressão, mesmo quando estressados?
Grande parte das pessoas que estão em minha volta são brancas, de diferentes faixas etárias, e majoritariamente, mulheres. Corpos que historicamente sofrem pela desigualdade de gênero resultada do machismo. Se elas tentarem levantar suas mãos para apartar, o que pode acontecer?
É duro ter que avaliar diversos cenários quando você é alvo. É violento demais ter que se precaver sobre a vida, quando você pode receber uma voadora. Por nada. Simples e puramente por existir. E partilhar isso com outra pessoa. Com minha parceira, por exemplo. Será que preciso conter minhas demonstrações de afeto, como um...abraço?
E se, durante esse ato público, receber um soco e não for rápido o bastante, o que faço?
É um fato: não há controle sobre relações. Tentar controlar aquelas criadas entre pessoas pretas é uma forma de violência que só permite um canal de sobrevivência: viveremos em guetos por medo de agressões?
Meu coração dói. É muita coisa pra pensar. Pós 13 de Maio, o dia da ''abolição'', só consigo pensar que precisamos de uma verdadeira.
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