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Eduardo Carvalho

Nem luxo, nem lixo: só a vacina

Getty Images
Imagem: Getty Images

30/12/2020 04h00

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Demissão nos últimos dias do ano, a promessa de vida em meu coração, festa no céu de Copacabana e no olhar. Nervos à flor da pele pelo início de um trabalho, um gigante desafio. "Nossa, que coragem", "Voa", "Estamos com você" são os votos. As asas tendem a ficar um pouquinho mais pesadas, tamanha responsabilidade.

Nova equipe, nova firma, novo crachá e cargo. Readaptar-se, bater cabeça, sair da caixa. "Você consegue, tem 21", me forçava a pensar.

Ajudar a construir uma empresa, vê-la nascer. "Será que vai dar certo?". Todos os olhos estavam voltados para nós, sabíamos disso, só não tínhamos dimensão do peso. O brinde pelo feito? No dia seguinte à estreia, o anúncio da pandemia mais avassaladora do século.

Corre, vai, cobre, pega fala, tenta entender, não entende, volta. Edita, escreve texto, grava cabeça. Entre gabinetes de crise, autoritários em autoridade, o mundo desabava. No início, era um. No meio, 100 mil. Agora, pouco falta para a marca de 200 mil vidas ceifadas.

Corpo baqueia. Cansaço? Não só. Do noticiar ao noticiado, virei dado, infectado pelo invisível vírus. Mexo e remexo na cama por 18 dias, volto acreditando na melhora, mas retorno para o lar. 20 dias isolado, um aniversário solitário e o pânico de contágio de meus familiares.

O período "sabático" nos possibilita a religar toda a rebimboca da parafuseta, e tomar decisões difíceis. "Não, não quero mais. Não aguento mais". Cabeças a mil, os ombros já não suportam tanto.

Mais um pedido de demissão.

Medo, ansiedade e a certeza de que o aluguel está pago. "Mas e no próximo mês? Será que consigo?". Quatro meses desempregado, procurando, tentando empreender. Não é fácil, não seria.

Se no meio do caminho tinha uma pedra, brotou no meu o convite para captar, como antena, as vivências e experiências desse espaço-tempo. Colocar em páginas a vida de personagens que existem, dando vazão à dinâmica favelada de mais uma pandemia. Um mês e meio de escrita, algumas madrugadas boas e voilà, tava feito.

Livro publicado, lives em Instagram, a honra de poder estar aqui em Ecoa e também na revista "Época". As luzes no fim do túnel, o encontro com o último rés de esperança. Agarrá-lo, tendo a exata compreensão dos feitos.

Você existiu e ponto, 2020. De minha pequenez enquanto ser, nada posso fazer para esquecê-lo. Seria egoísta de minha parte, birra, mal agrado. Mas também não vou tornar como "o ano da minha vida".

Se chorei ou se sorri, eu tenho certeza absoluta que emoções vivi, Roberto. Não acreditando em nada (só não duvidando da fé), não quero nem luxo, nem lixo. Para 2021, só a vacina. Pra mim, pra você, pra mim.

Vem junto?