Carlos Nobre

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Opinião

Novo relatório traz dados preocupantes sobre o clima global

Os relatórios anuais da OMM (Organização Meteorológica Mundial) fornecem uma síntese das previsões dos principais centros de meteorologia e climatologia do planeta. O relatório deste ano "Atualização climática anual e decenal da OMM (2025-2029)", publicado no final de maio, inclui 220 simulações realizadas por modelos climáticos de 15 diferentes instituições. Trata-se de um dos vários produtos que fornecem monitoramento de dados científicos e previsões de clima regional e planetário para subsidiar a tomada de decisões e nos ajudar a enfrentar a preocupante emergência climática.

Infelizmente, este novo relatório divulgou uma previsão climática que continua a soar o alarme. Prevê 80% de chance de que pelo menos um ano entre 2025 e 2029 supere 2024 como o ano mais quente já registrado. O relatório não fornece previsões globais para anos individuais. mas prevê que entre 2025 e 2029 a temperatura média global deverá ficar entre 1,2ºC e 1,9ºC acima do período pré-aquecimento global induzido pelo homem (1850-1900). No pior caso, estaríamos muito próximos de 2ºC com consequências catastróficas antes de 2030. Em 2024, ultrapassamos 1,5ºC e já estamos enxergando o ameaçador limite de 2ºC em poucos anos.

O relatório da OMM também destaca que o aquecimento do Ártico deverá continuar a ultrapassar a média global. O aquecimento do Ártico nos próximos cinco invernos (entre novembro e março) deverá ser mais de 3,5 vezes maior que a média global, 2,4°C acima da temperatura média durante o período de referência recente, de 1991 até 2020, um período que inclui o aquecimento devido a emissões que já ocorreram. Previsões de gelo marinho para os meses de março, de 2025 até 2029, sugerem novas reduções na concentração de gelo marinho nos mares de Barents, Okhotsk e Bering.

As previsões da OMM me preocupam porque desafiam as expectativas de que possamos diminuir a tendência de aumento da temperatura após o fim de um forte El Niño. O relatório prevê uma chance de 86% de que pelo menos um dos próximos cinco anos ultrapasse 1,5ºC acima dos níveis de pré-aquecimento global, com uma probabilidade de 70% de que a média dos cinco anos ultrapasse esse limite. Essa porcentagem é bastante superior aos 47% do relatório do ano passado que cobriu o período de 2024 a 2028 e aos 32% do relatório de 2023 que cobriu o período de 2023 a 2027. E isso pode reforçar que estamos no caminho de aquecimento de longo prazo acima de 1,5ºC que aciona vários pontos de não retorno, as mais graves ameaças à estabilidade do sistema terrestre.

As previsões climáticas globais do relatório mostram que as temperaturas devem continuar em níveis recordes ou próximos a eles nos próximos cinco anos, aumentando os riscos climáticos e abalando as sociedades do mundo inteiro. As alarmantes previsões do relatório reforçam como as mudanças climáticas aceleraram para além de muitas previsões climáticas realizadas por simulações matemáticas anteriores.

Os números fornecidos pela OMM nos mostram o quão longe poderemos estar de cumprir as metas do Acordo de Paris e vejo suas previsões como uma preocupante escalada nos perigos do aquecimento global causado pelo homem, à medida que a Terra continua sua marcha rumo às temperaturas superiores a 1,5ºC com implicações cada vez mais nocivas ao planeta como ondas de calor mais mortais, secas mais intensas, aumento dos incêndios florestais, mais eventos severos de chuva com vendavais, derretimento de camadas de gelo, geleiras e gelo marinho.

O Acordo de Paris indica que, para não ultrapassar 1,5°C até 2050, teríamos que reduzir as emissões em 43% até 2030 em relação às emissões globais de 2019 e zerar as emissões líquidas até 2050. Entretanto, os riscos não param de crescer. Por exemplo, 2024 teve a maior emissão da história e estudos indicam que poderíamos atingir uma pequena redução de 3% de emissões globais até 2030 e não a necessária redução de 43%. Nessa trajetória, poderemos até atingir 2,5ºC em 2050.

Segundo dados divulgados pelo observatório europeu Copernicus, a temperatura global continua acima de 1,5ºC. A média dos quatro primeiros meses de 2025 ficou em 1,61ºC. Ou seja, até agora, estamos acima dos 1,55ºC da média anual de 2024, o primeiro ano a ultrapassar o limite de 1,5ºC do Acordo de Paris.

Embora um ou dois anos acima de 1,5°C de aquecimento global não indique que as metas de temperatura de longo prazo do Acordo de Paris estejam fora de alcance, trata-se de um alerta de que estamos aumentando o risco de um ecocídio planetário. Em uma coluna recente aqui em Ecoa, falei em dois artigos científicos que indicam que 2024 poderia ser o primeiro de vários de anos com a temperatura acima de 1,5ºC.

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Precisamos urgentemente cortar as emissões de gases de efeito estufa, ou pagaremos um alto e generalizado preço por nossa inação e irresponsabilidade para com as futuras gerações. O enfrentamento à emergência climática está só começando, e cada fração de grau evitada reduzirá o sofrimento humano. A COP30 está logo ali para nos proporcionar mais uma oportunidade de combater a emergência climática.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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