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Anielle Franco

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

No centro da Roda Viva: um convite a escutar mulheres negras

Anielle Franco é a entrevistada do Roda Viva da próxima segunda-feira (22) - Bleia Campos / Reprodução / Instagram
Anielle Franco é a entrevistada do Roda Viva da próxima segunda-feira (22) Imagem: Bleia Campos / Reprodução / Instagram

22/11/2021 17h09

Hoje, dia 22 de novembro, às 22h, vou ser entrevistada no programa Roda Viva da TV Cultura. Então, começo esse texto não apenas com o convite, mas principalmente com o chamado para conhecer as mulheres pretas que sentaram na poltrona que vou ocupar nesta noite. Assim como a Taís Araújo fez, ao abrir sua pergunta para Zezé Motta há poucos dias dizendo: "quero começar te honrando, te saúdo, [saúdo] a sua trajetória e de quem veio antes de você, porque graças a vocês e a nossas mais velhas que a minha geração pode estar aqui hoje. Então, eu quero te honrar muito." Quero honrar muito todas vocês.

No último dia 15, Zezé Motta falou sobre sua carreira, sobre o quantas batalhas precisou travar nessas cinco décadas de trabalho, falou sobre olhar com orgulho a forma como a geração de hoje a abraça como artista. Durante a entrevista, o sorriso da Zezé não falhava, o que me fez lembrar de Mari, que durante todo tempo que esteve como vereadora, falava sobre sobre endurecer sem perder a ternura. E diante das perguntas voltadas para questões raciais, ela também contou sobre como foi aprofundar os estudos no tema, falou dos estudos com Lélia Gonzalez e de como se entendeu ainda mais como mulher negra depois desse encontro.

No dia Internacional da Mulher, 8 de março de 2021, foi a vez de Taís Araújo ser a entrevistada. Logo na abertura do programa é contado que o convite para a participação foi feito quase um ano antes, Taís disse que sentia que o momento era de ouvir e não de falar. Senti que já tinha aprendido muito e a entrevista mal tinha começado. Pode parecer algo simples, mas diante das nossas demandas, diante da pressão que vivemos depois de assumir um compromisso com a luta antirracista, saber pausar, saber dizer "não agora" a determinadas oportunidades é um ato de extrema sabedoria e cuidado consigo mesma. Antes mesmo de começar a falar, Taís já tinha mandado um recado para todas nós: a luta é contínua, mas também devemos parar para ouvir. E fui só escuta durante aquela entrevista com ela falando sobre a infância, do orgulho de sua origem, sobre conceitos de beleza acolhedores, sobre assumir a responsabilidade de ser referência, sobre construir uma família e todo seu significado.

Ainda neste ano, em setembro, quem se sentou no centro da Roda Viva foi Conceição Evaristo. E ela, como outras mulheres negras que estiveram ali, também foi perguntada sobre os avanços da sociedade nos aspectos raciais. Com toda sua eloquência, experiência, inteligência e cuidado, Conceição reafirmou a importância de darmos continuidade às nossas lutas, mesmo com pequenos avanços. Ainda que seja possível pontuar determinadas melhorias, o fato é, como ela mesma colocou: "O que eu não posso deixar de afirmar é que essa evolução não se deu gratuitamente. Foi preciso que nós, mulheres negras, em cada espaço que nós estejamos, é preciso sempre que a gente force essa passagem. É preciso que a gente empurre essa porta. Então, as nossas conquistas, elas são conquistas muito mais oriundas de lutas".

Benedita da Silva, em 2002, quando ainda era governadora do Rio de Janeiro ao sentar no centro da roda, defendeu as cotas raciais em um momento de polarização deste importante debate no Brasil, e quando ela, como governadora, implementou a primeira lei de cotas na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Benedita ao falar sobre "consciência negra" reforçou a necessidade do movimento negro ter maior "ousadia" e "unidade" para enfrentar críticas de classes opressoras. Ela diz "nossa consciência precisa estar mais aguçada para buscar nossos direitos, que não serão só para nós, mas para nossos filhos, nossos netos" e outras gerações.

Preciso dizer que além dessas três mulheres incríveis Chimamanda Adichie, Jurema Werneck e Erika Hilton, também vieram antes de mim. Preciso dizer que não apenas escutei como também me fortaleci a partir daquelas falas, para compartilhar a minha história, os meus estudos, as minhas origens e todo acúmulo que tive a frente do Instituto Marielle Franco e desde que minha irmã foi assassinada.

Nesta noite, nesta entrevista, me sinto pronta para conversar com todas, todes e todos, que estiverem disponíveis para ouvir a fala de uma mulher negra que existe, que luta e vive toda a intensidade e alegria que é ser uma mulher, negra, mãe e ativista no Brasil hoje.