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Anielle Franco

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Grupos prioritários e lactantes pela vacinação no Brasil

Mãe amamenta usando máscara - Ricardo Cassiano/Prefeitura do Rio de Janeiro
Mãe amamenta usando máscara Imagem: Ricardo Cassiano/Prefeitura do Rio de Janeiro

31/05/2021 06h00

Nos últimos dias, minhas redes sociais foram inundadas de fotografias de gestantes se vacinando, e ao mesmo tempo uma série de postagens de mulheres mães lactantes reivindicando o direito de se vacinar e proteger não apenas a si mesma, mas também a seus filhos e filhas recém-nascidos e as demais pessoas ao seu redor. Imediatamente, vi um debate sobre os grupos prioritários de vacinação e a contestação sobre as comorbidades de pessoas jovens que estavam se vacinando nesta semana.

Não preciso dizer que, hoje, o mais importante é conseguirmos atingir os 80% da população vacinada para começarmos a ter uma proteção geral, logo, cada pessoa vacinada nessa fila é importante, independente de como a vacina chegou ao seu braço, desde que tenha sido pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Mas, nessas discussões sobre grupos prioritários, comorbidades e vacinação, eu quero falar hoje sobre o grupo que faço parte… As lactantes. Antes disso, ressalto aqui a importância de todas e todos que podem se vacinar, se vacinarem e confiarem na vacina e também trago trechos que constam nas bulas das vacinas que estão sendo aplicadas em nosso país e que trazem reflexões sobre esse grupo.

Na bula da Vacina Coronavac (Sinovac/Butantan), não consta a contra indicação da vacinação em gestantes, mas sim a precaução, e chama atenção também a falta de informações em relação a lactantes: "Gravidez - Categoria B - Este medicamento não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica ou do cirurgião-dentista. Não existe informação sobre o uso da vacina durante a lactação". Já na bula da Vacina AstraZeneca/Oxford/Bio-Manguinhos também há ressalvas quanto ao uso da vacina em lactantes: "Gravidez e amamentação Categoria C''. Este medicamento não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica. Informe o seu profissional de saúde se você estiver grávida, amamentando, pensando engravidar ou planejando ter um bebê. Há dados limitados sobre o uso da vacina covid-19 (recombinante) em mulheres grávidas ou que estejam amamentando. Seu profissional de saúde discutirá com você se você pode receber a vacina". Deixando a cargo dos profissionais de saúde a indicação de vacinação para gestantes, puérperas e lactantes, o que já está acontecendo em vários municípios no caso de gestantes.

Quando comecei a pensar a escrever sobre este tema, fui em grupos de gestantes e puérperas que faço parte para entender melhor como estava se dando esse movimento, e descobri uma articulação chamada Lactantes Pela Vacina, que é uma campanha promovida por mulheres que amamentam e que defendem que esta parcela da população também deve estar em grupos prioritários para a tomada da vacina da covid-19.

Entre os principais argumentos estão o posicionamento de organizações e especialistas das áreas de pediatria, saúde coletiva e imunologia e também a comprovação da chamada "imunização cruzada", ou seja, quando a mãe recebe a vacina, os anticorpos desenvolvidos passam para o filho/filha por meio do leite materno. Dessa forma, com apenas uma dose, duas pessoas seriam imunizadas. Outro ponto importante que esse grupo organizado defende - e que eu particularmente também endosso e pratico na minha vida materna, é a defesa da possibilidade da amamentação prolongada -, além da redução de risco para aquela mãe, que assim como eu, meses depois de ter seu filho/filha e ainda amamentando, precisou retornar para o trabalho presencial, se expondo a contaminação pelo vírus da covid-19 e correndo o risco de adoecer no ambiente profissional e contaminar sua criança.

Vale ressaltar que, embora os casos em crianças sejam menos frequentes e por vezes a doença se manifeste de forma mais branda, o Brasil lidera o ranking de mortalidade infantil pela covid-19, tendo mais crianças mortas no país do que em qualquer lugar do mundo. Em pouco mais de um ano, mais de 2 mil crianças com menos de 9 anos de idade morreram pela covid-19, dessas, 1,3 mil eram bebês com até 1 ano de idade.

Ainda que o Plano Nacional de Imunização (PNI) seja uma verdadeira confusão e dependendo do seu município, nem mesmo mulheres gestantes com orientação médica ainda podem se vacinar, o movimento de gestantes e puérperas têm conseguido, gradativamente, algumas vitórias. Um exemplo é o Estado da Bahia, que neste mês passou a incluir mulheres lactantes com filhos de até 1 ano nos grupos de vacinação.

O debate sobre grupos prioritários, comorbidades e acesso a vacinação é amplo e deve ser levado com a maior seriedade possível. No entanto, é importante estarmos atentos para não reproduzirmos um discurso de priorizações e direito à saúde, que desconsidera o fato de vivenciarmos atualmente uma escassez de vacina, onde é claro, é necessário dar prioridade a determinados grupos. Ao mesmo tempo, é importante sempre lembrarmos que felizmente vivemos em um país onde o sistema sistema universal e que o direito à vacinação é e deve permanecer garantido para todas e todos brasileiros e brasileiras.