Fizeram História

'Galdino vive': Morte de indígena queimado fortaleceu luta pataxó

Por Juliana Domingos de Lima

Em 1997, na madrugada seguinte às comemorações do dia do indígena em 19 de abril, cinco jovens atearam fogo em um homem que dormia em uma parada de ônibus em Brasília.
O homem era Galdino Jesus dos Santos, liderança do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, do sul da Bahia. Ele tinha ido à capital com outros líderes para tratar da recuperação e demarcação das terras do seu povo, tomadas por fazendeiros.
Karenalmeid/Creative Commons
Galdino não conseguiu entrar na pensão onde estava hospedado e se abrigou em uma parada da avenida W3 Sul, na região central, para descansar. Após o ataque, os agressores fugiram. O líder indígena sofreu queimaduras graves e morreu.
Galdino era a 17ª liderança pataxó assassinada desde 1982. Diferente de outros, o crime ganhou repercussão nacional e acabou dando visibilidade aos conflitos de terra vividos pelos povo Pataxó.
Antonio Cruz/Agência Brasil
Nascido em 1952, Galdino testemunhou desde cedo a brutalidade do processo de expulsão dos pataxós de seus territórios tradicionais por fazendeiros de cacau e gado.
Reprodução
Território Pataxó, a reserva indígena Caramuru-Paraguassu foi reconhecida em 1926 pelo Serviço de Proteção ao Índio e demarcada nos anos 1930. Até a década de 1970, porém, fazendeiros promoveram invasões, expulsando 95% da população original.
André Olmos/Creative Commons
Entre 1976 e 1982, o governo do estado da Bahia extinguiu a reserva e passou a emitir títulos de posse para os invasores. A partir dos anos 1980, os pataxós também começaram a retomar parte dessas terras.
Valter Campanato/Agência Brasil

O assassinato de Galdino é lembrado com muita tristeza por nós, pataxós, como um mártir que acabou perdendo a vida na batalha pelo nosso território. A história brasileira é contada do ponto de vista dos invasores, mas pra sociedade indígena representa muita coisa.

Agnaldo Pataxó Hã Hã Hãe,
coordenador do Movimento Unido dos Povos e Organizações da Bahia
O assassinato inspirou novas retomadas e uma união ainda maior de seu povo. O nome de Galdino passou a ser lembrado a cada terra ocupada como símbolo de resistência.
Renato Santana/CIMI
Depois de um longo julgamento, o STF reconheceu em 2012 o direito dos pataxós às terras Caramuru-Paraguassu, anulando os títulos concedidos a fazendeiros.
Wilson Dias/Agência Brasil

Recebemos [a terra] totalmente destruída, rios destruídos, mata destruída. Passamos mais de trinta anos lutando e ainda estamos em estado de recuperação, re-estabilizando a comunidade.

Agnaldo Pataxó Hã Hã Hãe,
coordenador do Movimento Unido dos Povos e Organizações da Bahia
Jovens de classe média alta, Max Rogério Alves, Antonio Novely Vilanova, Tomás Oliveira de Almeida, Eron Chaves Oliveira e Gutemberg Nader de Almeida Júnior foram condenados pela morte de Galdino em 2001, mas tiveram regalias e puderam cumprir parte da pena em liberdade.
Em Brasília, o local do crime ganhou uma escultura em homenagem ao indígena e foi renomeado como Praça do Compromisso "para a criação de um compromisso nacional contra a violência e pela solidariedade aos pobres e oprimidos", segundo o decreto do então governador do DF, Cristovam Buarque.
Luis Dantas/Creative Commons
Publicado em 09 de abril de 2022.
Reportagem: Juliana Domingos de Lima

Edição: Fernanda Schimidt