Biblioteca antirracista

Ecoa selecionou livros indispensáveis para hoje (e sempre)

Nos últimos dias, o mundo tem assistido a uma nova onda de protestos que demandam o fim do racismo. Mas como isso pode ser feito? A resposta é simples e foi dada por Angela Davis.
Lucas Jackson/Reuters

Numa sociedade racista, não basta não ser racista. É necessário ser antirracista

Angela Davis,
filósofa e professora da Universidade da Califórnia
Reprodução
Por isso, Ecoa preparou uma lista de livros para ajudar quem quer colaborar com a construção de um mundo mais igualitário.
Craig Lassig/EFE

Memórias Póstumas de Brás Cubas

Machado de Assis (domínio público)
O celebrado escritor carioca abordava em suas obras as questões raciais do Brasil ainda no século 19. Neste livro, que é considerado sua obra-prima, é possível notar como atitudes racistas se perpetuam e, por isso, é importante se posicionar.
Arte/UOL

Era um modo que o Prudêncio tinha de se desfazer das pancadas recebidas, - transmitindo-as a outro. Eu, em criança, montava-o, punha-lhe um freio na boca, e desancava-o sem compaixão; ele gemia e sofria. Agora, porém, que era livre, dispunha de si mesmo, dos braços, das pernas, podia trabalhar, folgar, dormir

Trecho de "Memórias Póstumas de Brás Cubas",
a obra pode ser acessada de forma gratuita

Mulheres, Raça e Classe

Angela Davis (Boitempo)
Todos os livros de Angela Davis publicados no Brasil pela editora Boitempo são fundamentais. Mas, em "Mulheres, Raça e Classe", a filósofa estadunidense analisa as intersecções das opressões no cenário de seu país. A obra é leitura obrigatória para entender as diferenças estruturais entre as mulheres brancas, mulheres negras e até mesmo os homens negros.
Arte/UOL

Aquelas [mulheres brancas do Norte] de melhor situação econômica começaram a denunciar o caráter insatisfatório de sua vida doméstica, definindo o casamento como uma forma de escravidão. Para as trabalhadoras, a opressão econômica sofrida no emprego tinha uma forte semelhança com a escravidão

Trecho de "Mulheres, Classe e Raça",
R$ 43,20

Sem Gentileza

Futhi Ntshingila (Dublinense)
"Sem Gentileza" é uma leitura crua que revela diversas facetas dos problemas causados pela colonização, o apartheid, a Aids e a evangelização forçada na África do Sul. A autora Futhi Ntshingila é um dos destaques da nova geração de escritoras africanas que está ganhando espaço no mundo.
Arte/UOL

Mvelo foi às sessões de teste de virgindade com clareza no pensamento. (...) E como muitas garotas de sua idade, estava curiosa para ver o que e como era o teste. Descobriu que havia testadoras que estavam preocupadas com o abuso infantil disseminado e que enxergavam o teste como a forma tradicional de resolver o problema

Trecho de "Sem Gentileza",
R$ 39,00

Malcolm X - Uma vida de reinvenções

Manning Marable (Companhia das Letras)
A luta antirracista foi grande parte da vida de Malcolm X, e também o motivo que levou a seu assassinato. Ainda que a história do fundador da Organização para a Unidade Afro-Americana seja envolta em polêmicas, é inegável a sua contribuição para o conhecimento e para a defesa dos direitos da população negra em todo mundo. A obra de Manning Marable (foto) é leitura para ampliar horizontes.
Arte/UOL

No fim dos anos 1960, Malcolm X encarnava o ideal de negritude para uma geração inteira. Como W. E. B. Du Bois, Richard Wright e James Baldwin, ele tinha denunciado os custos psicológicos e sociais que o racismo impusera à sua gente; também era largamente admirado como homem de ação intransigente

Trecho de "Malcolm X - Uma vida de reinvenções",
R$ 87,90

Quando me Descobri Negra

Bianca Santana (Sesi)
Em um relato leve mas contundente, a colunista de Ecoa Bianca Santana fala sobre como foi para ela se descobrir uma mulher negra já na idade adulta. O texto aborda temas como colorismo, miscigenação e microrracismos que muitas vezes são ignorados ou minimizados pela sociedade.
Arte/UOL

Sou negra há menos de um ano. Antes, era morena. Minha cor era praticamente travessura do sol. Era morena para as professoras do colégio católico, coleguinhas - que talvez não tomassem tanto sol - e para toda a família que nunca gostou do assunto. 'Mas a vó não é descendente de escravos?', eu insistia em perguntar.

Trecho de "Quando me descobri negra",
R$ 27,97

Se a Rua Beale Falasse

James Baldwin (Companhia das Letras)
Fonny e Tish iam se casar, mas antes disso ele é preso. A história de amor rapidamente se transforma em uma história de luta e sobrevivência. Enquanto Tish tenta tirar o amado da prisão, Fonny luta para manter sua saúde mental em ambiente tão hostil. Neste livro, James Baldwin expõe as fraturas do sistema carcerário dos EUA e mostra como a cadeia separou famílias por décadas.
Arte/UOL

Nunca encontrei nenhuma vergonha aqui, a não ser uma vergonha como a minha, a não ser a vergonha das senhoras negras que dão um duro danado, que me chamam de filha, (...) e que sentem vergonha por terem pessoas que amam na prisão. Mas estão erradas em se sentir envergonhadas. As pessoas responsáveis por essas prisões é que deviam sentir vergonha.

Trecho de "Se a Rua Beale Falasse",
R$ 49,90

O que é lugar de fala?

Djamila Ribeiro (Editora Letramento)
A mestra em filosofia Djamila Ribeiro reuniu parte dos maiores intelectuais negros do país na coleção Feminismos Plurais, que destrincha as questões de raça e de gênero no país. É o primeiro livro que explica didaticamente o conceito de lugar de fala. Para ela, o conceito não deve ser usado para fugir dos debates raciais que constroem o Brasil.
Arte/UOL

Se mulheres, sobretudo negras, estão num lugar de maior vulnerabilidade social justamente porque essa sociedade produz essas desigualdades, se não se olhar atentamente para elas, se impossibilita o avanço de modo mais profundo

Trecho que "O que é lugar de fala?",
R$ 20,00

Americanah

Chimamanda Ngozi Adichie (Companhia das Letras)
Um clássico imediato, o livro conta a história de Ifemelu, uma mulher que emigra da Nigéria para os EUA em busca de uma oportunidade. Mas ao chegar lá, se dá conta do racismo de uma forma que não conhecia em sua terra natal. A história de Ifemelu se parece com a história de Chimamanda. A autora já revelou em entrevistas que decidiu criar sua filha na Nigéria para que não tivesse contato com o racismo na infância.
Arte/UOL

Ifemelu deu um meio sorriso de pena, porque Cristina Tomas certamente tinha alguma espécie de doença que a fazia falar tão devagar, com os lábios espremidos (..) e Ifemelu entendeu que a menina estava falando daquele jeito por causa dela, de seu sotaque, e durante um instante sentiu-se como uma criança pequena, de braços e pernas moles, babando.

Trecho de "Americanah",
R$ 64,90

Tudo Nela Brilha e Queima

Ryane Leão (Planeta)
Ryane Leão começou colando versos em lambe-lambe pela cidade e compartilhando na internet suas poesias sobre a força da mulher preta, suas angústias, dores e prazeres. Já com dois livros publicados, a jovem cuiabana é uma das principais vozes de sua geração.
Arte/UOL

resiste, preta / é o que sinto vontade de dizer / mas sei também que machuca / permanecer na fronte / de pé e armada

Trecho de "Tudo Nela Brilha e Queima",
R$ 24,90

Você Morre Quando Esquecem Seu Nome

Flávio M. Costa (Bissau Livros)
A cidade mais negra do Brasil, Salvador é o palco dos oito contos reunidos neste livro escrito pelo jornalista do UOL, Flávio M. Costa. A violência policial e o racismo descritos na obra fazem com que essas histórias se tornem uma espécie de realidade brasileira disfarçada de ficção.
Arte/UOL

Sim, eu sou preto, nunca neguei a ninguém e sou um preto diferente porque nunca perdi um amigo para a violência. Nunca havia perdido, quero dizer. Todo preto é diferente, você me dirá, toda pessoa é única, tem suas particularidades, suas idiossincrasias, você usará essas palavras bonitas, como se eu estivesse desacostumado a ouvi-las.

Trecho de "Você Morre Quando Esquecem Seu Nome",
R$ 17,90

O Olho Mais Azul

Toni Morrison (Companhia das Letras)
A pequena Pecola Breedlove só queria ter olhos azuis. Mas ela nasceu negra em uma sociedade racista. O primeiro livro de Toni Morrison, primeira e única mulher negra a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura, é um tratado sobre os efeitos do racismo nas crianças negras.
Arte/UOL

Eu destruía bonecas brancas. Mas o desmembramento de bonecas não era o verdadeiro horror. O que eu realmente aterrorizava era a transferência dos mesmos impulsos para garotinhas brancas. A indiferença com que eu poderia trucidá-las era abalada apenas pela minha vontade de fazer isso. Para descobrir o que me escapava: o segredo da magia que elas exerciam sobre os outros.

Trecho de "O Olho Mais Azul",
R$ 47,60

Um Defeito de Cor

Ana Maria Gonçalves (Editora Record)
Pouco se tem registrado da escravidão no Brasil a partir das perspectivas do escravizado. Com uma pesquisa que durou mais de seis anos, Ana Maria Gonçalves retrata a vida de uma mulher que foi sequestrada na África, viveu na escravidão e penou por ela, mesmo depois de conquistar a liberdade. Narrado em primeira pessoa, o livro pinta um retrato fiel da escravidão e da vida em diáspora.
Arte/UOL

Ainda naquele dia abriram a portinhola e mandaram que nos sentássemos o mais junto possível da parede do navio. Era difícil nos mexermos, e os guardas se aborreceram, gritando que se não quiséssemos comida era para avisar, porque eles não dispunham do dia todo, tinham mais o que fazer além de dar comida a preto

Trecho de "Um Defeito de Cor",
R$ 74,93

Memórias da Plantação

Grada Kilomba (Cobogó)
Neste livro, Grada Kilomba fala sobre como o racismo cotidiano se transportou através do tempo desde as colônias escravagistas até os dias atuais, tendo como alvo principalmente as mulheres negras. Um dos maiores méritos do livro é expor o elo entre as práticas coloniais e o racismo. Portuguesa, Kilomba decidiu escrever o livro em inglês pois entendia que sua língua natal era a língua do colonizador.
Eduardo Knapp/Folhapress

Nós nos tornamos a representação mental daquilo com que o sujeito branco não quer se parecer. Toni Morrison usa a palavra 'dessemelhança' para descrever a branquitude como uma identidade dependente que existe através da/o 'Outra/o', uma identidade relacional construída por brancas/os que define a elas/es mesmas/os como racialmente diferente das/os outras/os.

Trecho de "Memórias da Plantação",
R$ 33,60

Olhos D'água

Conceição Evaristo (Pallas)
Os contos que compõem o livro abordam a pobreza, o racismo e o machismo de forma escancarada, mas poética. A protagonista do livro é a mulher negra brasileira apresentada em toda a sua diversidade, potência e vulnerabilidade. Conceição Evaristo é dona de uma produção inigualável na contemporaneidade e, justamente pelo racismo que denuncia em seus livros, demorou anos para ser reconhecida.
Arte/UOL

Lembro-me ainda do temor de minha mãe nos dias de fortes chuvas. Em cima da cama, agarrada a nós, ela nos protegia com seu abraço. E com os olhos alagados de prantos balbuciava rezas a Santa Bárbara, temendo que o nosso frágil barraco desabasse sobre nós.

Trecho de "Olhos D'água",
R$ 22,40

O que é racismo estrutural?

Entenda o que está por trás dos casos de violência contra a população negra no Brasil
Publicado em 07 de junho de 2020.
Reportagem: Beatriz Sanz
Edição: Fernanda Schimidt