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Receita de cerveja pode incluir grão de milho ou quirela de arroz

Os cereais não malteados presentes nas cervejas industriais podem ser provenientes de arroz e milho - Thinkstock
Os cereais não malteados presentes nas cervejas industriais podem ser provenientes de arroz e milho Imagem: Thinkstock

Rafael Mosna

Do UOL, em São Paulo

10/01/2014 17h21

O rótulo da cerveja descreve que, entre seus ingredientes, estão água, malte e cereais não malteados. Mas quais cereais são esses? Na maioria dos casos, entre as brasileiras, tratam-se de grits (espécie de grão quebrado) de milho e quirela de arroz, que podem ser acrescentados em até 45% do total do volume da bebida, segundo a legislação vigente (decreto 6.871, de 2009), para que seja chamada simplesmente de cerveja.

"Historicamente, os cereais não malteados começaram a ser utilizados para a diminuição de custo e também pela dificuldade de acesso ao malte. Hoje em dia, majoritariamente, a questão do custo ainda é a mais relevante. Mas não é uma regra. Existe caso em que o ingrediente utilizado é algumas vezes mais caro do que o malte", diz Carolina Oda, beer sommelière do Ici Brasserie.

Kaiser e Nova Schin, além de marcas que fazem parte do portfólio da Ambev como Skol, Brahma, Serramalte, Stella Artois e Bohemia, são alguns exemplos facilmente encontrados em supermercados que usam os cereais não malteados em suas receitas (procurada pelo UOL, a empresa não comentou sobre o tema até o fechamento deste texto).

"No decorrer da história, [esse tipo de cerveja] acabou virando um perfil de estilo. Sim. É um estilo oficial de cerveja. O mais produzido no mundo e o que a maioria das pessoas ainda gosta. Quanto maior for a proporção desses cereais em relação ao malte, mais neutra será a cerveja. Ou seja, com menos [presença de] sabor", acrescenta Carolina.

Fazer a bebida com uma composição não necessariamente 100% malte não está restrito às cervejas produzidas em grande escala. "Em seu uso 'tradicional', cereais não malteados possuem uma intenção específica, como acontece com a witbier, cerveja belga de condimentos e trigo, que, nesse caso, contribui com uma sensação de refrescância e que deixa seu corpo ligeiramente mais leve", explica Alessandro Morais, diretor da Lamas Brew.

"É comum em cervejarias artesanais a utilização de pequenas quantidades de trigo para melhorar a qualidade da espuma das cervejas. Ou também a utilização de aveia para dar cremosidade à bebida", conta Alfredo Ferreira, ex-mestre cervejeiro da Heineken e atual Instituto da Cerveja.

Alfredo cita exemplos que podem ser encontrados no Brasil, como a Tripel Karmeliet e a Anderson Valley (estilo oatmeal stout), ambas com aveia, e a Cantillon Gueuze e a Grass Roots, da cervejaria dinamarquesa Mikkeller, elaboradas com trigo não malteado.

'Acervejada'
Ainda de acordo com a legislação nacional, se a inclusão dos tais cereais não malteados excederem os 45%, o fabricante deve informar no rótulo qual é a maior parte de sua composição. Trocando em miúdos, algo como "cerveja de X ou Y".

Para Raimundo Padilha, sommelier do The Beer Planet, a questão é controversa. "Aqui no Brasil, o percentual é definido por lei, mas em outro países é diferente. Na Alemanha, é zero: para ser considerada cerveja, a bebida não pode ter nenhum resquício de cereais não malteados", diz.

"Quem sou eu para desdenhar o nativo peruano que faz sua chicha [tipo de bebida fermentada] de milho, o cervejeiro chinês que faz seu fermentado de arroz, o africano que faz o seu de sorgo [tipo de cereal] ou ainda menos o imaginativo cervejeiro caseiro que pode usar isso tudo? Há muitos outros fermentáveis como açúcares de diversas origens, raízes como a da mandioca e do gengibre que, para mim, são igualmente bons", relativiza Marcelo Carneiro da Rocha, proprietário da Colorado.

Alessandro, da Lamas, é categórico. "Um líquido produzido com quase metade de milho ou arroz deveria se chamar 'fermentado alcoólico tipo cerveja', e não uma pilsen, para que não fosse passada a ideia errada ao consumidor. Uma boa analogia é a comparação entre presunto e apresuntado. Você não pode produzir um apresuntado e estampar na embalagem que se trata de um presunto. Essa é a diferença entre uma 'acervejada' e uma verdadeira cerveja."