Cúmplice por engano: quando comprar peça para seu carro vira um crime

Consertos no carro costumam ser caros, e muitos motoristas buscam alternativas para tentar economizar no mecânico. O problema é que o barato por custar caro, e a compra de uma peça roubada pode levar um consumidor desavisado, mesmo que tenha tido 'boa-fé', para a prisão.

O Código Penal brasileiro trata como receptação culposa a falta de cuidado quanto à origem do objeto comprado ou recebido que tenha origem criminosa. Ou seja, se alguém compra a peça de um automóvel na internet por um preço mais interessante, sem nota fiscal ou garantia de procedência, pode estar cometendo esse crime, mesmo que não tenha a intenção de fazê-lo.

A lei fala em "adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte".

Como não cair em uma cilada

Antonio Fiola, presidente do Sindicato da Indústria de Reparação de Veículos, explica que o primeiro passo para se livrar de problemas com a Justiça é, ao adquirir a peça, exigir nota fiscal.

"No documento haverá comprovação da procedência da peça. Agora, quando a pessoa encontra uma peça muito abaixo do preço de mercado em uma plataforma de e-commerce e não pede comprovação nenhuma ao vendedor, fica difícil provar inocência", alerta.

Fiola explica que existem desmanches legais, que recondicionam peças usadas de outros veículos, mas eles são cadastrados pelo Detran e seguem os protocolos de segurança. Ele alerta também que peças de segurança como freio, ABS, direção, airbags, entre outras, jamais podem ser reutilizadas. Ou seja, se não for nova e estiver à venda, provavelmente é produto de crime.

O consultor Rodrigo Boutti explica que é preciso tomar um cuidado extra na hora de comprar as peças pela internet, principalmente em sites em que pessoas físicas podem colocar produtos à venda.

"A chance dessas peças virem de desmanches ilegais e de carros roubados é muito grande. Se você vende em uma loja física, precisa atender à Lei do Desmanche, ou seja, tem que comprovar a origem da peça. Mas se você compra pela internet, sem saber se é uma loja que está comercializando, corre o risco de comprar uma peça roubada ou falsificada. É importante verificar sempre se o vendedor é confiável."

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Lei do Desmanche

As peças automotivas, em São Paulo, devem ter adesivo indicando procedência
As peças automotivas, em São Paulo, devem ter adesivo indicando procedência Imagem: Foto: Shutterstock

Em vigor desde 1º de julho de 2014 no Estado de São Paulo, a Lei 15.276, mais conhecida como "Lei do Desmanche", foi implementada para controlar a atividade de depósitos, oficinas e empresas especializadas no comércio de peças retiradas de outros veículos.

A iniciativa, que regulamenta lei federal de mesmo teor, busca reduzir a incidência de furtos e roubos de automóveis e motocicletas para desmontagem e abastecimento do mercado ilegal de componentes veiculares usados. Dentre outras coisas, a lei determina que as empresas sejam cadastradas anualmente no Detran-SP e na Secretaria da Fazenda e Planejamento do governo paulista.

Além disso, todas as peças comercializadas têm de trazer um adesivo dotado de QR Code, o código bidimensional que possibilita o respectivo rastreio - ou seja, dá para identificar o tipo, a marca, o modelo e o ano do veículo de onde foi retirada. As empresas flagradas desrespeitando as regras são impedidas de seguir atuando no setor, informa o departamento estadual.

Como comprar peças mais baratas

Tomar um cuidado extra para não comprar peças roubadas não significa comprar apenas peças originais da montadora, existe um grande mercado alternativo, que não é produto de crime. A Anfape - Associação Nacional dos Fabricantes de Autopeças - explica que existem diferentes tipos de peças.

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"As similares, por exemplo, são reconhecidas no mercado em que atuam, possuem a devida identificação de procedência e garantia. São aquelas produzidas por empresas independentes, encontradas nas lojas de autopeças", explica a entidade.

"Há, ainda, outros tipos de peças, como as originais, produzidas pelos mesmos fornecedores das montadoras; as piratas - frutos da utilização indevida de marcas alheias - ou as usadas, que são demandadas de atividades de desmanche e, bem sabemos, uma quantidade substancial provém de furtos e roubos de veículos", completa.

Para a associação, a melhor opção entre elas são as similares, que podem custar até 50% menos do que as originais.

"A melhor opção é sempre a peça similar comercializada nos varejos de autopeças. A economia pode chegar a 50% do valor cobrado na concessionária. Mas, fique atento, as peças similares são oferecidas pelas fabricantes independentes, possuem procedência de qualidade e marca própria. Elas não são encontradas em desmanches ilegais", alerta a Anfape.

Essas peças são confiáveis?

Danilo Fraga, diretor de inteligência de mercado da Fraga Inteligência Automotiva, explica que devido ao tamanho e robustez do mercado, o consumidor poderá se deparar com produtos de diversos níveis de confiabilidade. Desde marcas que são as fornecedoras da montadora e que vendem o mesmo produto no mercado de reposição independente até produtos de baixo custo e qualidade.

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"O fato de a peça não ser genuína não desqualifica a procedência da mesma, afinal, existem centenas de fabricantes especializadas no mercado de reposição que possuem tecnologia e processos fabris que garantem excelência nos produtos comercializados", pondera Fraga.

Segundo Fraga, o reparador é o principal aliado do consumidor na escolha de peças. "Quando uma peça de má qualidade é instalada no veículo, a probabilidade de falha deste produto aumenta significativamente. Ocorrendo a falha técnica, o mecânico precisará novamente desmontar e refazer o serviço sem custos. Por esse motivo, é comum que algumas oficinas só ofereçam garantia integral do serviço quando elas próprias realizam a compra dos produtos."

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*Com informações de matéria publicada em 09/10/2022

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