Pai mostra filha caindo de minimoto; criança pode pilotar em condomínio?

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Um vídeo publicado no Instagram viralizou ao mostrar o passeio de um pai "motoqueiro" e a filha, que pilota uma minimoto pelas ruas de um condomínio. A menina cai da moto e é acudida pelo pai.
O que aconteceu
Nas imagens que viralizaram, o pai aparece pilotando uma motocicleta ao lado da filha, uma menina de cerca de sete anos, que também conduz uma minimoto infantil. Ambos usam capacetes e pilotam em baixa velocidade. Segundo o pai explicou na legenda do post, o passeio aconteceu em um condomínio residencial.
A menina cai ao ser surpreendida por uma lombada com pouca sinalização. Abalada, ela corre chorando até o pai e pede colo. Ele a abraça, checa se está machucada, examina a moto e avisa que será preciso consertar o para-lama. Em seguida, o vídeo corta para os dois rodando novamente pelas ruas do condomínio, enquanto a filha comenta: "Pai, você falou um ditado, né? 'Quem anda cai'. Mas a culpa é do moço que não pintou o quebra-molas". O pai responde: "É, o moço do quebra-molas está muito errado".
Na legenda, o pai, em tom bem-humorado e reflexivo, diz que ficou orgulhoso da "pilota", sua filha, mas admite que o tombo o fez pensar. Ele disse que se sentiu confrontado com o fato de ser o porto seguro de uma criança, o que o deixou pensativo. O UOL procurou o pai da criança, mas ele preferiu não se pronunciar.
Nos comentários da publicação, as pessoas se dividiram entre elogios e críticas. Alguns destacaram a coragem da criança e o afeto entre pai e filha. Outros demonstraram preocupação com a segurança. "Se tivesse acontecido algo mais grave, o discurso seria outro", escreveu uma seguidora. "Só espero que a Justiça não vá responsabilizar esse pai por fazer o que muitos queriam ter feito: criar memórias com a filha", opinou outra pessoa.
O UOL ouviu especialistas em direito civil, digital, de família e da infância sobre o caso. Os advogados apontam que a condução de veículos por crianças e a exposição de suas imagens em situações de vulnerabilidade, ainda que em contexto familiar, podem configurar risco jurídico para os responsáveis.
Pode pilotar minimoto?
Veículos ciclomotores requerem registro e habilitação. Segundo o Código de Trânsito Brasileiro, ciclomotor é o veículo com motor de até 50 cm³ (ou equivalente elétrico) e velocidade máxima de 50 km/h. Minimotos infantis nem sempre se enquadram nessa categoria, mas algumas podem ser classificadas como ciclomotores dependendo da potência e da velocidade. "O uso de minimoto exige cautela, pois ela pode ser classificada como veículo ciclomotor e requerer registro e habilitação", afirma Fernanda Escane, advogada e professora da Escola Paulista de Direito e do FMU. Os pais podem responder por imprudência mesmo sem acidente.
Há jurisprudência (decisões anteriores) proibindo o uso de miniveículos por crianças e adolescentes em áreas comuns de condomínios, explica o advogado Douglas Cabral Ferreira Silva, especialista em direito imobiliário e processo civil. Ele cita um caso julgado pela 5ª Vara Cível de Ribeirão Preto, em que o juiz determinou a proibição da circulação desses veículos por menores de 18 anos no interior do condomínio. Na sentença, o magistrado afirmou que "é induvidoso que o uso de veículos ou miniveículos motorizados por menores de 18 anos coloca em risco a integridade física desses infantes, como também de terceiros".
Pais podem ser responsabilizados por permitir condutas imprudentes dos filhos.
Douglas Cabral Ferreira Silva, advogado
Os pais podem responder civilmente por omissão na vigilância, mesmo em áreas privadas. "Se a criança sofre ou causa dano, a responsabilidade recai sobre quem detém o poder familiar", diz a advogada Vanessa Paiva, especialista em direito de família e sucessões. Permitir a pilotagem pode ser visto como criação de risco injustificado.
Já o condomínio pode ser responsabilizado se a ausência de sinalização no quebra-molas contribuiu para o acidente. "Se comprovada a omissão, há responsabilidade civil", afirma Douglas. Ele cita uma decisão do TJ-SP que obrigou um condomínio a indenizar um morador após um acidente semelhante. Douglas lembra que, se o local for loteamento com vias públicas, a obrigação pode ser do município ou de uma associação de moradores.
Mesmo com afeto, os responsáveis devem garantir a segurança da criança. A responsabilidade deles é civil, administrativa e até penal.
Douglas Cabral Ferreira Silva
Pode postar?
Vídeos com crianças em situações de dor ou susto podem ser considerados abusivos. "Mesmo postado por pais, o conteúdo pode ferir o direito à dignidade e privacidade, garantido pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente)", afirma a advogada Cynthia Arruda, especialista em direitos da criança e do adolescente. A boa intenção não elimina o risco jurídico.
A exposição de crianças em vídeos emocionais pode gerar consequências jurídicas mesmo em contas pessoais. "A proteção da criança deve prevalecer sempre que houver risco de constrangimento ou estigmatização", afirma o advogado Lucas Uster, especialista em direito digital e crimes cibernéticos.
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