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Por que picapes como a Ford Ranger são feitas na Argentina e não no Brasil

Ranger já tem nova geração garantida após investimento milionário da Ford - Murilo Góes/UOL
Ranger já tem nova geração garantida após investimento milionário da Ford
Imagem: Murilo Góes/UOL

Vitor Matsubara

Do UOL, em São Paulo (SP)

02/12/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Comerciais leves têm participação bem maior no mercado argentino
  • Picapes têm tradição: Toyota Hilux é líder geral de vendas no país vizinho
  • Bom número de fornecedores locais ajuda a baixar custos de produção

A Ford anunciou ontem (1) que investirá US$ 580 milhões para produzir a nova geração da Ranger na Argentina.

A picape será lançada em 2023 e a fábrica de General Pacheco será responsável por abastecer o mercado da América Latina. Não à toa, 70% do volume produzido por lá será destinado para exportação.

Além do investimento expressivo, outro ponto chama atenção: a Ranger é apenas uma das picapes fabricadas em solo argentino.

Nada menos do que quatro modelos vendidos no Brasil são trazidos de lá: além da Ranger, as rivais Volkswagen Amarok, Nissan Frontier e Toyota Hilux são feitas no país vizinho. E olha que não estamos contando a Renault Alaskan, que é vendida apenas no mercado argentino.

Em contrapartida, somente duas picapes (Chevrolet S10 e Mitsubishi L200) vendidas no Brasil são produzidas aqui. Aí fica a pergunta: por que os "hermanos" levam a melhor sobre o Brasil?

Tradição argentina

Toyota Hilux - Divulgação - Divulgação
Novo visual deve manter Hilux na liderança do mercado argentino
Imagem: Divulgação

O motivo principal está na força do mercado de picapes, que é bem expressivo na Argentina.

Números da Acara (a associação equivalente à Fenabrave daqui) indicam que, dos 459.592 veículos produzidos por lá em 2019, 107.068 foram comerciais leves. O volume equivale a 23,3% do total.

Enquanto isso, dos 2.787.250 veículos fabricados no Brasil no ano passado, apenas 403.514 foram comerciais leves. Neste caso, o volume correspondeu a 14,5% do total. Os números foram divulgados pela Anfavea.

Toyota Hilux 2 - Murilo Góes/UOL - Murilo Góes/UOL
Picape da Toyota vende mais que Onix e Gol por lá
Imagem: Murilo Góes/UOL

No ano passado, a Toyota Hilux foi o carro mais vendido da Argentina com 25.120 unidades. Parece muito? Então saiba que o modelo amargou uma queda de 33% em suas vendas frente a 2018, quando emplacou nada menos do que 33.483 unidades.

A diferença entre os países não se limita às estatísticas. Se o brasileiro é fã confesso de SUVs, o argentino prefere as picapes. Isso não significa que os utilitários esportivos não têm público fiel por lá - muito pelo contrário.

Entretanto, muitos clientes que possuem SUVs de luxo acabam trocando seus carros por picapes.

Ferramenta de trabalho

Toyota Hilux - Marcos Camargo/UOL - Marcos Camargo/UOL
VW Amarok é uma das picapes feitas na Argentina
Imagem: Marcos Camargo/UOL

Um dos motivos está no nível de sofisticação de modelos como Chevrolet S10 e Ford Ranger, que hoje são equipadas com tecnologias presentes em utilitários esportivos e sedãs. Piloto automático adaptativo, alerta de colisão frontal, frenagem autônoma de emergência e sensor de pontos cegos estão entre eles.

A outra razão é um mal que também acomete os brasileiros: as péssimas condições das estradas e ruas demandam veículos que sejam mais robustos e consigam rodar em vias sem pavimento. E nada melhor de que uma picape para isso.

Ford Ranger - Murilo Góes/UOL - Murilo Góes/UOL
Picapes são classificadas como 'ferramentas de trabalho'
Imagem: Murilo Góes/UOL

E o terceiro motivo está no chamado "imposto de luxo". A medida criada pelo governo em 2017 atingiu a maioria dos SUVs médios e grandes, que ficaram mais caros. Só que as picapes ficaram de fora por serem classificadas como "ferramentas de trabalho". Assim, as picapes acabam custando menos do que os SUVs.

Boa base de fornecedores

Nissan Frontier - Divulgação - Divulgação
Fábrica de Córdoba produz Nissan Frontier e Renault Alaskan
Imagem: Divulgação

Por fim, a indústria automotiva argentina se beneficia de um fenômeno chamado pela imprensa local de "bola de neve".

Isso porque, com a abertura das primeiras fábricas no país, vários fornecedores também começaram a operar na Argentina. Isso permite um elevado nível de nacionalização das peças, o que acaba reduzindo os custos de produção em relação a outros países - como o próprio Brasil.