Topo

Porsche 718 Cayman GT4 é a certeza de que dirigir por esporte é possível

Porsche 718 Cayman GT4 - Divulgação/Rossen Gargolov
Porsche 718 Cayman GT4
Imagem: Divulgação/Rossen Gargolov

Rodrigo Mora

Colaboração para o UOL, em Edimburgo (Escócia)*

17/07/2019 07h00

A Porsche apresentará o Taycan, seu primeiro esportivo 100% elétrico, no próximo Salão de Frankfurt, entre 12 e 22 de setembro. O que acontecerá daqui a 56 dias talvez seja a maior ruptura na história de 71 anos da marca alemã - mais profunda e controversa até do que ter lançado um SUV (o Cayenne, em 2002) ou ter abandonado os motores refrigerados a ar do 911, carro-chefe da empresa, em 1997.

Intencional ou não, há uma mensagem subliminar no lançamento imediatamente anterior ao Taycan: podemos ter entrado de vez na irreversível era da eletrificação, muito mais focada em eficiência energética do que prazer ao volante, mas ainda sabemos fazer carros para entusiastas, como o 718 Cayman GT4.

O modelo que logo mais chega à Europa e desembarca por aqui até o fim do primeiro semestre de 2020 (por algo entre R$ 500 mil e R$ 600 mil) é a versão mais radical do 718 Cayman. Este parte de R$ 329.000 e carrega entre o banco do motorista e o eixo traseiro um 2.0 turbo de quatro cilindros e 300 cv, acoplado a um câmbio de dupla embreagem e sete marchas.

Volante do Porsche 718 Cayman GT4 - Rossen Gargolov/Divulgação - Rossen Gargolov/Divulgação
Imagem: Rossen Gargolov/Divulgação
Na frieza da ficha técnica, o novo não é tão superior ao antigo GT4, de 2015. A velocidade máxima subiu 9 km/h, batendo nos 304 km/h, enquanto a aceleração até os 100 km/h se manteve em 4,4 segundos.

Mas compare os tempos de volta em Nürburgring, pista de 20,6 km de extensão no noroeste da Alemanha, em que o novo foi nada menos que 12 segundos mais rápido do que o anterior, virando 7 minutos e 28 segundos, e tenha a real dimensão do que é capaz a segunda geração do esportivo.

Segundo a Porsche, apenas um quarto disso é responsabilidade do motor 4.0 seis-cilindros, de 420 cv e 42,8 kgfm de torque administrados por um câmbio manual de seis marchas. Não se trata de uma previsível evolução do 3.8 da primeira geração, mas sim de um desenvolvimento exclusivo para o novo modelo.

Que parte do 3.0 seis-cilindros do Porsche 911 atual, mas dispensa o turbo e ganha virabrequim forjado de alta resistência, novos cabeçotes e um sistema de válvulas que permite ao motor girar até 8.000 rpm.

O resto é mérito do chassis, com eixo dianteiro, amortecedores traseiros invertidos e subchassi traseiro emprestados do 911 GT3, praticamente um carro de corrida com bênção para andar na rua.

E há também um novo difusor traseiro, entre as duas saídas de escapamento, que não está ali para fins estéticos. "Quando falamos de um difusor, queremos dizer um difusor", brinca Markus Atz, gerente de projetos da linha GT. De acordo com a Porsche, essa peça e o protuberante aerofólio aumentaram em 50% o downforce do novo GT4. Resultado: a 300 km/h, são 122 kg empurrado a traseira do carro para baixo, aumentando assim a estabilidade.

Porsche 718 Cayman GT4 - Rossen Gargolov/Divulgação - Rossen Gargolov/Divulgação
Imagem: Rossen Gargolov/Divulgação
Track day

Na essência, o 718 Cayman GT4 é um brinquedo para milionários, que devem agora mesmo estar ligando desesperados para o concessionário local a fim de reservar o seu - por aqui, foram apenas 17 unidades comercializadas. Será o segundo, quiçá terceiro carro, cujo destino mais frequente será uma pista, como a Knockhill Racing Circuit, a 30 minutos de Edimburgo, na Escócia, onde UOL Carros experimentou o GT4.

Claro que as rodas aro 20, as cores berrantes e todo o conjunto aerodinâmico entregam que esse Porsche é esportivo. Mas, na cabine, dá para sacar de olhos fechados que o GT4 é esportivo raiz. O volante é revestido em Alcantara, uma espécie de camurça que está ali para absorver o suor das mãos do motorista nos momentos de adrenalina.

Não há rádio ou ar-condicionado (que são opcionais), porque sem eles economiza-se 4,5 kg. Ajustes elétricos também são incompatíveis com os bancos do tipo concha, só ajustáveis em distância do volante. É como se a Porsche decidisse por você como deve ficar seu encosto, e ela está absolutamente correta, porque é posição de guiar nasce naturalmente.

Há esportivos mais escandalosos na hora de dar a partida. O GT4 é sereno. Primeira marcha engatada na alavanca igualmente revestida em Alcantara, escuta-se e sente-se os movimentos da transmissão. A embreagem é o exato meio do caminho entre leveza e peso. Vamos devagarinho assim pelos boxes, até o final da reta principal.

A primeira volta é de reconhecimento. Segunda e terceira marchas entram fácil, sugerindo que o GT4 pode ser se não dócil, ao menos razoável no dia a dia. A direção diz o mesmo.

Na hora de afundar o pé no acelerador na primeira volta a valer, a segunda marcha leva o carro a quase 120 km/h. Parece que o motor não vai acabar, prolongando o prazer de quem gosta de ouvir aquele ronco encorpado, meio contraditório na hora de descrevê-lo: é agudo, irritado, mas com notas graves ao fundo.

Ninguém duvida de que o Taycan será vibrante ao volante. Mas silenciosamente. O GT4 toca num ponto fundamental para entusiastas: o som. Ele está para o motor assim como o cheiro está para a comida. Um bife suculento vai te alimentar e dar prazer, mas parte do sabor vai embora se você não puder sentir o aroma.

A terceira marcha agora é chamada com mais violência, e parece que o câmbio até prefere assim. O distância para o engate da quarta é um piscar de olhos, enquanto a quinta nem chega, pois já é hora de montar nos freios de 380 mm e perceber que nos antecipamos: daria pra frear bem mais em cima da hora, que eles segurariam.

Na leve curva à direita e depois na caída à esquerda, mais longa, o GT4 mostra um equilíbrio natural. O motorista, à essa altura já se sentindo um piloto, percebe que tanto a traseira quando a dianteira do carro estão onde deveriam, sem esparramadas. O próximo trecho é um "S" em subida, que pouco mexe com a compostura do cupê. Você sente que a traseira poderia sair, mas não vai.

A última curva antes da reta é bem fechada, feita em segunda. Quem sair dela com muito apetite vai conhecer o excesso de proteção do controle de tração, que poderia ser mais permissivo e deixar os pneus Michelin Pilot Sport Cup 2 (245/35 ZR20 na frente e 295/30 ZR20 atrás) deslizarem um pouco, incrementando a diversão. Mas tudo bem, basta aliviar o pé, alinhar o volante e acelerar de novo.

Ao fim do teste, a sensação é a do reencontro com um piloto que só existe na minha imaginação. E isso é o melhor que o Cayman GT4 pode fazer por você.

O pior é botar uma dúvida cruel na cabeça: com essa grana na conta bancária você compraria ele ou um 911 de entrada?

Ficha técnica

Motor: 4.0 seis-cilindros boxer, 24 válvulas
Potência: 420 cv a 7.600 rpm
Torque: 42,8 kgfm a 5.000 - 6.800 rpm
Câmbio: manual, seis marchas
Comprimento: 4,46 m
Largura: 1,80 m
Altura: 1,27 m
Entre-eixos: 2,48 m
Porta-malas: 150 litros
Peso: 1.420 kg

*O repórter viajou a convite da Porsche