Paula Gama

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ReportagemCarros

Fiorinos arqueados: como é a moda perigosa que desafia leis no trânsito

Uma cena preocupante viralizou nas redes sociais nos últimos dias: um vídeo exibe dois exemplares do Fiat Fiorino com suspensão drasticamente modificada para elevar a traseira da respectiva carroceria,

Esse é apenas um exemplo da modificação que teve início nos caminhões e é conhecida como "suspensão arqueada"

No vídeo em questão, a dianteira dos furgões compactos quase encosta no chão, enquanto a traseira fica erguida ao extremo.

Além de estar "arqueado", um dos veículos exibe o para-brisa dianteiro coberto por um adesivo perfurado que simula olhos de personagens do filme "Carros", comprometendo completamente a visibilidade.

Outro Fiorino traz um adesivo gigante do grupo GBN (Grupo Baseados na Noite) 13 AM, coletivo de caminhoneiros com mais de 180 mil seguidores no Instagram.

Apesar do caráter inusitado, cenas como essa não são inéditas e escancaram uma prática que já é velha conhecida das autoridades de trânsito, e que o UOL Carros vem denunciando desde 2022.

O que são veículos arqueados?

Os chamados veículos "arqueados" são aqueles que têm a suspensão alterada de forma radical: a parte dianteira é rebaixada ao máximo, enquanto a traseira é elevada.

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O resultado é um desnível tão acentuado que compromete a estabilidade, o controle e a segurança do veículo. O estilo, que nasceu entre caminhoneiros ,chegou a modelos menores como o Fiorino, um utilitário leve que circula principalmente em áreas urbanas.

A estética extrema vem sendo propagada principalmente por grupos nas redes sociais. Um dos veículos do vídeo exibe justamente o nome do grupo GBN, um dos mais influentes nesse movimento.

Com presença em WhatsApp, Facebook e Instagram, o GBN divulga diariamente imagens de caminhões, e agora também vans, com a suspensão modificada, dentre outros conteúdos sobre a vida na estrada.

O UOL Carros enviou mensagem para o grupo no respectivo perfil no Instagram, mas até o momento não recebeu retorno do coletivo.

Por que é proibido?

De acordo com a Resolução 916 do Contran (Conselho Nacional de Trânsito), a altura mínima entre o solo e qualquer parte do veículo deve ser de pelo menos 10 cm, o que não acontece na maioria dos veículos arqueados cujas imagens circulam nas redes sociais.

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Além disso, o sistema de suspensão não pode permitir que rodas e pneus toquem partes da carroceria em manobras. Também não são permitidas alterações na suspensão que comprometam a estabilidade.

Ainda que estejam dentro da Lei, alterações desse tipo só são permitidas com aprovação prévia, vistoria e registro no CRLV (Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo). Fora dessas condições, trata-se de infração gravíssima, que prevê 7 pontos na CNH (Carteira Nacional de Habilitação), multa e retenção do veículo até a respectiva regularização.

No caso de caminhões, a legislação é mais específica: o desnível máximo permitido na extensão do veículo é de 3,5 centímetros por metro de comprimento.

Alterações além desse limite são proibidas, especialmente porque, em caso de colisão traseira, veículos menores podem literalmente entrar sob a carroceria elevada do caminhão.

Adesivo de olhos no para-brisa

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Imagem: Reprodução
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Além da suspensão irregular, o vídeo mostra um dos Fiorinos com o para-brisa coberto por um adesivo perfurado que simula olhos animados, como os personagens do filme Carros.

Apesar de não conter luzes de LED, como outras versões vistas em caminhões, o problema é o mesmo: obstrução do campo de visão do motorista.

Segundo o CTB (Código de Trânsito Brasileiro) e a Resolução 960 do Contran, qualquer item que comprometa a visibilidade frontal é considerado irregular.

A infração é média, com multa de R$ 130,16, quatro pontos na carteira e retenção do veículo até a regularização.

"O para-brisa é um item indispensável à dirigibilidade. Inserir elementos que prejudiquem a visão do condutor configura uma infração clara ao CTB e ao bom senso no trânsito", destaca Marco Fabrício Vieira, conselheiro do Cetran-SP (Conselho Estadual de Trânsito de São Paulo).

Prática já causou tragédias

Esta coluna acompanha o assunto desde 2022, quando os primeiros caminhões arqueados começaram a ganhar notoriedade, inclusive com a ocorrência de acidentes fatais.

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O caso mais emblemático ocorreu na BR-116, quando o caminhoneiro Gerson Mattos colidiu na traseira do veículo do próprio pai. O caminhão arqueado estava com a traseira tão alta que a cabine da vítima foi esmagada sob a carroceria. Ele e sua mulher morreram na hora.

A tragédia acendeu um alerta e motivou uma grande operação da Polícia Rodoviária Federal para coibir essas alterações. No entanto, a fiscalização perdeu força meses depois, quando o então ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas (hoje governador de São Paulo), criticou publicamente a medição de altura dos caminhões.

A migração dessa prática para veículos menores, como o Fiorino, é mais um alerta de como a estética pode se sobrepor à segurança. Sem nenhuma justificativa funcional, o arqueamento é feito apenas por aparência.

"Não traz nenhum benefício técnico, apenas risco. Compromete frenagem, estabilidade e a dirigibilidade como um todo", alerta o engenheiro Rodrigo Kleinubing.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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