Paula Gama

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Estacionamento no Minhocão: o que são as vagas colocadas debaixo do viaduto

Quem passa pela Avenida Amaral Gurgel, na região central da cidade, vai notar uma mudança na paisagem: um trecho da ciclovia que ficava sob o Elevado Presidente João Goulart, o Minhocão, foi alterado para abrigar quatro vagas de estacionamento. As obras, iniciadas no fim de abril, foram anunciadas como parte de um projeto-piloto para coibir o descarte irregular de lixo e estão localizadas no canteiro central da via, entre as ruas Major Sertório e General Jardim.

Apesar de parecer algo simples, a medida já causa divergências e foi protocolada até uma Ação Popular para revertê-la.

A proposta foi divulgada pelo vice-prefeito e secretário de subprefeituras, coronel Mello Araújo (PL), como uma medida experimental. Segundo a gestão municipal, o local sofre com o acúmulo de resíduos deixados por caçambeiros e moradores de prédios do entorno, o que, de acordo com a prefeitura, inviabilizava o uso da ciclovia.

A Prefeitura informou ao UOL Carros que a obra "segue recomendações da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET)" e que a nova configuração inclui uma ciclovia bidirecional com 2,5 metros de largura - mantendo 1,25 metro por sentido - e uma faixa de 1 metro para pedestres, entre as baias de estacionamento e a estrutura cicloviária.

Parecer técnico da CET

Antes do início das obras, a CET emitiu o parecer técnico nº 123793199, datado de 14 de abril de 2025. No documento, a companhia classifica a Rua Amaral Gurgel como via arterial, usada para conexões de longa distância entre regiões da cidade. O parecer indica que vagas a 45° não seriam viáveis, por comprometerem a segurança e a permanência da ciclovia.

A CET ainda considerou a possibilidade de vagas lineares - como as que foram instaladas - em trechos específicos, com adaptações como ciclovia bidirecional e instalação de gradis, o que não foi feito.

Reações no Legislativo

A implantação do estacionamento foi tema de debate na Câmara Municipal em 5 de maio. O encontro foi promovido por vereadores das bancadas do PT, PSOL e Rede Sustentabilidade, com participação de Marina Bragante (Rede), Luna Zarattini (PT), Renata Falzoni (PSB), Professor Toninho Vespoli (PSOL) e Nabil Bonduki (PT).

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Durante a discussão, parlamentares levantaram críticas ao projeto, especialmente pela ausência de consulta pública e pela alteração da ciclovia que existia no local desde 2015.

A implantação das vagas de estacionamento também impactou diretamente a população em situação de rua que ocupava a área sob o Minhocão. Embora a justificativa oficial da Prefeitura seja o combate ao descarte irregular de lixo, vereadores e organizações da sociedade civil apontam que a obra resultou na retirada dessas pessoas do local.

A vereadora Renata Falzoni, uma das responsável pela Ação Popular, junto com o vereador Nabil Bonduki, afirmou que "a ciclovia e a calçada estão sendo retiradas para dar mais espaço a carros estacionados" e que "o descarte de lixo irregular se combate com fiscalização e aplicação da lei".

Ela ainda declarou: "Tudo que São Paulo não precisa é mais área para estacionamento de carros. Fica evidente a real intenção de tirar daqui a população em situação de rua. Um problema gravíssimo da nossa cidade que só piora, e claramente, as políticas adotadas não são suficientes."

Nabil Bonduki questiona a falta de debate técnico e social. O vereador disse que a rua Amaral Gurgel já enfrenta congestionamentos diários e que a inserção de vagas de estacionamento pode aumentar os conflitos no trânsito. "A população em situação de rua vai continuar nas calçadas das cidades, porque não é possível você achar que só por ocupar um pedaço da calçada que é usada pela população em situação de rua, você vai eliminar o problema".

Associação de ciclistas critica

A Ciclocidade (Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo) também se posicionou. Em nota, a entidade afirmou que a medida representa uma "inversão de prioridades", ao ampliar o espaço para carros em detrimento de modos de transporte sustentáveis.

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Segundo a associação, houve "falta de transparência e participação popular" na tomada de decisão e a alteração da ciclovia, com possível remoção em outros pontos, "desestimula o uso de meios de transporte não poluentes".

Próximos passos

A Prefeitura classifica a intervenção como um teste de viabilidade, com possibilidade de expansão a outros trechos sob o Minhocão, caso os resultados sejam considerados positivos. A gestão afirma que, ao fim da implantação, a ciclovia será reestruturada e devidamente sinalizada, com espaço garantido para circulação de pedestres.

Enquanto isso, o tema segue sendo acompanhado de perto por parlamentares, entidades civis e usuários da região, que aguardam os desdobramentos da Ação Popular e as próximas etapas do projeto-piloto.

Reportagem

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