R$ 60 mil de bônus: vender carro para concessionária vira melhor opção
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Por muitos anos, a regra no mercado automotivo era clara: se você quisesse vender seu carro usado antes de comprar um novo, era melhor fazer isso 'por fora', negociando diretamente com um comprador ou até mesmo com uma loja especializada em seminovos. As concessionárias, por sua vez, sempre foram conhecidas por oferecer valores baixos na troca por um automóvel zero-km. Mas esse cenário está mudando.
Hoje, várias marcas estão oferecendo bônus generosos no chamado trade-in, tornando a troca na concessionária uma opção mais vantajosa do que vender o carro por conta própria. Há casos em que os bônus chegam a R$ 15 mil em marcas generalistas e podem ultrapassar R$ 60 mil em veículos premium.
Esse movimento reflete uma transformação profunda no mercado de usados, especialmente no segmento de seminovos, que se tornou extremamente competitivo. Em 2024, o mercado de usados bateu um recorde histórico no Brasil, com quase 16 milhões de unidades vendidas, sendo 2,5 milhões de carros de zero a três anos de uso.
Como explica o consultor automotivo Ricardo Bacellar, essa tendência vem de uma série de fatores que mudaram completamente as regras do jogo.
A valorização dos seminovos
O mercado de automóveis sofreu uma verdadeira revolução nos últimos anos, impulsionada pela pandemia. Durante a crise sanitária, a demanda por veículos disparou, mas a produção foi prejudicada por problemas na cadeia de suprimentos, como a falta de chips eletrônicos. Isso gerou um fenômeno inédito: o preço dos seminovos subiu tanto que, em alguns casos, modelos usados passaram a custar mais do que os zero-quilômetro.
"A gente vinha de um cenário em que o carro zero desvalorizava 30% pouco tempo após sair da concessionária. Isso era um fato consumado. Mas esse padrão foi completamente alterado", explica Bacellar.
A crise de oferta fez com que os seminovos se tornassem ainda mais atrativos, já que a espera por um carro novo poderia levar meses. Com isso, as concessionárias perceberam que poderiam lucrar não só na venda de veículos zero-quilômetro, mas também revendendo os seminovos que entravam como parte do pagamento.
A partir desse momento, esse mercado se tornou estratégico para as redes de concessionárias. Depois, veio outro fenômeno: os carros novos ficaram tão caros que a procura por modelos com poucos anos de uso seguiu em alta, pois o consumidor dos modelos de entrada teve que migrar para os de segunda mão.
"As concessionárias começaram a perceber que poderiam seduzir o consumidor oferecendo valores mais justos no trade-in e, ao mesmo tempo, revender esse carro com uma boa margem de lucro", explica Bacellar. Como resultado, muitas passaram a adotar o bônus de troca, oferecendo valores mais atrativos para o usado como forma de facilitar a venda do novo.
O que vale (ou não) na troca
Embora o movimento seja vantajoso para quem quer trocar de carro, há um detalhe importante: as concessionárias estão interessadas, principalmente, em seminovos. Elas continuam tendo pouco interesse em veículos muito rodados. O foco está nos carros com até três anos de uso, que ainda estão na garantia e são mais fáceis de revender.
Além disso, a avaliação do veículo está mais rigorosa. Não basta ser seminovo: o carro precisa estar bem cuidado, com baixa quilometragem, sem histórico de sinistro ou passagem por leilão. "Os lojistas fazem uma análise minuciosa do veículo antes de aceitá-lo na troca, porque precisam garantir que terão um produto de qualidade para revender rapidamente", explica o consultor.
Mais concorrência, mais vantagens
Outro fator que está impulsionando essa mudança no mercado é o aumento da concorrência. Hoje, há muito mais marcas brigando pelo consumidor no Brasil, e isso fez com que as montadoras precisassem lançar mão de estratégias agressivas para não perder vendas. Isso faz com que as marcas aceitem pagar por parte desse "bônus" de trade-in para aumentar sua participação no mercado.
"Quanto mais players você tem, mais alternativas o consumidor tem. E, em um ambiente competitivo, as concessionárias e as marcas precisam ser mais espertas e criativas para não perder o cliente", afirma Bacellar.
O bônus de troca é uma dessas estratégias. Ele permite que a montadora mantenha seus preços de tabela competitivos, ao mesmo tempo em que oferece um incentivo financeiro para que o cliente feche negócio. E há outra vantagem para as concessionárias: muitas vezes, o consumidor entra na loja interessado em um seminovo e sai com um zero-quilômetro.
"Aquele cliente que chega para comprar um seminovo pode ser seduzido pela oferta de um carro novo com um bônus na troca. O vendedor joga o desconto na mesa, mostra as vantagens do financiamento e, de repente, convence o cliente a sair com um modelo zero", explica o especialista.
Além da questão financeira, há um fator psicológico que pesa a favor da troca na concessionária: a segurança. Quem já tentou vender um carro por conta própria sabe dos riscos envolvidos. Marcar encontro com desconhecidos, negociar com atravessadores, correr o risco de golpes ou até mesmo de assaltos são preocupações reais para quem tenta vender o carro sozinho.
"Muitas lojas oferecem revisão, garantias adicionais e até serviços para facilitar a transferência do veículo, quase como se estivesse comprando um carro novo. Isso passa uma segurança maior para o comprador", diz o especialista.
O futuro do mercado de usados
O que antes era uma prática limitada a poucas montadoras agora se tornou tendência. Concessionárias e fabricantes perceberam que não podem mais ignorar o mercado de seminovos, que continua sendo a opção mais acessível para muitos brasileiros.
Com a crise econômica e o alto preço dos carros novos, a tendência é que o setor de usados continue forte, e as redes de concessionárias seguirão buscando maneiras de torná-lo ainda mais atrativo.
No fim das contas, esse novo cenário representa uma vitória para o consumidor, que agora tem mais poder de negociação e pode encontrar boas oportunidades sem precisar se arriscar vendendo o carro por conta própria.
A velha máxima de que "é sempre melhor vender por fora" já não vale mais como uma regra absoluta. Agora, cada caso precisa ser avaliado, pois, dependendo do modelo e do bônus oferecido, trocar o carro na concessionária pode ser o melhor negócio.
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