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Suzuki e o adeus à MotoGP: em busca do futuro ou consertando o passado?

Suzuki GSX-RR, uma das mais belas e competitivas MotoGP da atualidade - Suzuki/divulgação
Suzuki GSX-RR, uma das mais belas e competitivas MotoGP da atualidade Imagem: Suzuki/divulgação

Colunista do Uol

19/05/2022 21h32Atualizada em 20/05/2022 01h10

A notícia de que a Suzuki abandonará a MotoGP no final desta temporada caiu como uma bomba no paddock da categoria mais importante do motociclismo, e causou estranhamento especialmente por ter a marca renovado seu contrato de participação por cinco anos em novembro do ano passado, ou seja, há menos de um semestre.

MotoGP - Suzuki/Divulgação - Suzuki/Divulgação
Team Suzuki na MotoGP, 50 pessoas desempregadas ao fim de 2022
Imagem: Suzuki/Divulgação

O que levou uma companhia do porte da Suzuki, a 3ª das quatro grandes fabricantes de motocicletas do Japão (atrás de Honda e Yamaha, à frente de Kawasaki), e também muito forte no mundo dos automóveis, a dar marcha a ré depois de tão pouco tempo? O comunicado oficial da Suzuki, que poderia esclarecer fatos, é seco e dúbio. Divulgado em 12 de maio passado, até dá margem a uma mudança de posição, pois diz que a empresa "está discutindo com a Dorna..." (a organizadora da MotoGP), "a possibilidade de encerrar sua participação na MotoGP ao final de 2022". E emenda que a razão da atitude é econômica, e que o dinheiro será redirecionado para "desenvolver novas tecnologias."

Aos fatos: o CEO de qualquer empresa, assim como o pipoqueiro da porta da escola, tem todo o direito de rever os planos de negócio a qualquer momento. Porém, sendo a Suzuki uma corporação que deve satisfações a acionistas, o buraco é mais embaixo. Investidores sabem que este tipo de anúncio não só causa danos à imagem da empresa como derruba o valor das ações da empresa na bolsa, e da primeira fofoca sobre o adeus à MotoGP, em 1º de maio, até o comunicado da semana passada, a Suzuki Motor Corporation perdeu 11% de seu valor na bolsa de Tóquio. Mas talvez o dado mais significativo seja observar o valor das ações da companhia entre novembro de 2021 (pouco depois de ter renovado a participação na MotoGP) e meados de março, período onde o valor das ações da companhia caiu 30%. Bem mais do que redirecionar o investimento, a atitude soa como consertar um erro.

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Joan Mir. campeão da MotoGP em 2020 com a Suzuki e seu parceiro Alex Rins, sem guidão para 2023
Imagem: Suzuki/Divulgação

Quanto exatamente economizaria a Suzuki dispensando os 50 funcionários de sua equipe, os pilotos Alex Rins e Joan Mir e capando o investimento técnico nas máquinas da MotoGP? Cerca de 150 milhões de euros segundo meu bem informado colega Günther Wiesinger, do prestigioso portal teutônico Speedweek, que aproveitou também para lembrar que deste valor deve ser descontada a multa por quebra do contrato a ser paga à Dorna, cifra que jamais saberemos, pois departamentos jurídicos são surdos ante a este tipo de questão. Para uma empresa deste porte estes 150 milhões de euros é um dinheiro de pinga.

O que resta desse imbroglio é que nós, os aficionados pelo esporte da moto, perdemos uma marca forte na cena do motociclismo de alto nível. Os pilotos Rins e Mir ficaram chateadíssimos, mas certamente estarão no grid de 2023 em guidões das marcas restantes, Aprilia, Ducati, Honda, KTM ou Yamaha, assim como grande parte dos 50 desempregados da equipe Suzuki vão se recolocar na MotoGP mesmo ou em outra categoria top. É chato também constatar que, dada a bandeirada da corrida final da MotoGP 2022 em Valência, em 6 de novembro próximo, as belas Suzuki GSX-RR - aliás belas mesmo, além de muito competitivas! - vão para a prensa, ou empoeirar em museus.

Digerido o provável dano de imagem à marca, a queda no valor das ações da bolsa, a Suzuki deveria aproveitar este episódio para adotar uma nova postura diante de seu potencial técnico, tomar vergonha na cara e passar a usar sua capacidade de seus engenheiros em prol do consumidor, e não apenas usar o esporte como ferramenta de marketing. Digo isso como fã do motociclismo e principalmente como motociclista, pois sei que a Suzuki atualmente só tem motos antiquadas em seu catálogo. São boas, mas antiquadas, e nada daquilo que aprendeu desenvolvendo a GSX-RR da MotoGP respingou em produto.

Vejam, por exemplo, o tradicional cartão de visitas tecnológico de toda marca de motocicletas, as superesportivas. Basta comparar a vetusta Suzuki GSX-R 1000 com suas rivais, Honda CBR 1000RR-R, Ducati Panigale V4S ou BMW S 1000RR-R e... Coitada da Suzuki! A tecnologia do modelo à venda tem uma década de retardo face às citadas. E o que dizer da maxitrail da marca? Colocar uma Suzuki V-Strom perto de uma BMW R 1250GS, Honda Africa Twin ou Ducati Multistrada é covardia em termos tecnológicos.

Puxar o freio de mão na gastança na MotoGP sem o devido direcionamento do ensinamento das pistas à produção parece, no fim das contas, uma ação correta desde que tal dinheiro seja mesmo investido em "desenvolver novas tecnologias", como diz o comunicado. É realmente o caso inclusive tendo em vista que o mundo da competição, como o conhecemos até agora, no qual os motores térmicos movidos a combustíveis fósseis são os dominantes, não tem futuro. A Suzuki, possivelmente, está em busca do seu, se houver.