Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Relembre a trajetória da Troller, marca que a Ford revigorou e sacrificou
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(SÃO PAULO) - Gurgel, Miura, Puma, Envemo, Santa Matilde, Engesa, Chamonix, Lafer, Lobini, Farus, Dacon, Bianco, Brasinca, Hofstetter, Cintra, Romi, Ibap, Aurora, San Vito, Adamo, Glaspac...
A lista de fabricantes de origem brasileira é extensa e salpicada por histórias nebulosas, personagens idealistas e carros ora geniais, ora grotescos. Nesta peculiar e ímpar seara, nenhuma empresa foi tão bem-sucedida quanto a Troller, que dada sua trajetória se descola da imagem de fabricante de modelos fora-de-série.
Mas, lá em 1994, fundada pelo engenheiro cearense Rogério Farias em Horizonte, a 40 quilômetros de Fortaleza, a Troller era apenas uma fabricante de jipes (quase cópias do Jeep Wrangler) que não passava de quatro exemplares por mês, destinados a campeonatos de rali - que serviam como laboratório para o desenvolvimento do utilitário.
Em 1997, já com o empresário Mário Araripe na empreitada, a Troller dá início à produção em série com o RF Sport, em princípio equipado com um motor 1.8 antes do 2.0 de 110 cv, estreante no ano seguinte. No interior, volante de Gol e bancos em couro.
Três anos depois, o T4 ganhava um motor a diesel (MWM 2.8 turbo), mais adequado a um utilitário do seu naipe. E assim o jipe cearense seguia ganhando mercado e fãs e recebendo melhorias no decorrer dos anos: capota de fibra, DVD, travas e vidros elétricos, ajustes na suspensão, entre outros aprimoramentos.
Algumas versões especiais surgiram no caminho. Como a Expedition, limitada a 100 unidades e equipada com bagageiro, capa de estepe personalizada e um souvenir pitoresco: o comprador ganhava uma jaqueta com as cores da edição especial (amarelo e cinza) bordada com seu nome e tipo sanguíneo. Outra versão especial foi a Desert Storm, de 2011.
Até que em 2007 a Ford comprou a Troller - por R$ 500 milhões, especula-se. Para muitos, o interesse estava não no carro, mas sim nos incentivos fiscais cedidos à Troller na condição de empresa nordestina, o que beneficiaria a planta da Ford em Camaçari, na Bahia.
O que a marca norte-americana fez na sequencia foi modernizar a planta de Horizonte, o que resultou em 500 novas peças e interior renovado para o Troller.
Em 2014, quase dois anos após ser revelado no Salão de São Paulo, o conceito TR-X se converteu na segunda geração do T4. Na nova fase, o jipe enfim ganhou uma identidade visual própria. Destaque para o teto, que podia trazer duas partes de vidro, sem forro interno.
Destaque era o desempenho, garantido pelo motor 3.2 turbodiesel, de 5 cilindros, 200 cv e 48 kgfm de torque, emprestado da Ranger. Clientes passaram a reclamar que o snorkel, antes um item de série essencial para o jipeiro raiz, agora fazia parte de uma lista de 130 opcionais.
Para coroar a "gourmetização" daquele que um dia fora um bruto do fora-de-estrada, uma versão automática foi lançada em 2020, por R$ 167.530.
Dakar e Sertões
Farias via nas competições off-road não apenas um campo de provas real para o desenvolvimento técnico de seu veículo, mas também uma propaganda das suas habilidades. Em 2000, a Troller mandou quatro exemplares para o rali Paris-Dacar-Cairo. O modelo era um T5, maior e mais potente do que o T4, e até que não foi mal: 4ª, 6ª e 11ª posições na categoria Novatos.
No mesmo ano, a marca venceu o Rally dos Sertões em três categorias. Em 2001, conquistou o segundo lugar na categoria Diesel no Paris-Dakar.
Uma competição própria foi criada em 2003: a Copa Troller, dividida nas categorias Passeio, Expedition, Turismo, Graduados e Master. Foi cobrindo uma das etapas desse campeonato monomarca que tive a oportunidade de dirigir uma Pantanal, picape apresentada no Salão do Automóvel de São Paulo de 2004 e lançada pouco mais de um ano depois.
Seu destino era a labuta, não o lazer. Equipada com um motor MWM 3.0 turbodiesel de 163 cv e 38,8 kgfm de torque, entregava acelerações vigorosas. A traseira, composta por uma caçamba de plástico reforçado com fibra de vidro, era extremamente leve, e portanto a cada curva contornada um pouco mais rapidamente sobre o chão de terra já demandava um contra-esterço - em outras palavras, era preciso corrigir o volante para que a picape não rodasse. A alavanca de câmbio instalada incrementava a diversão ao volante.
No entanto, essa foi uma experiência vivenciada por poucos. Em fevereiro de 2008, a Ford convocou os proprietários das 77 unidades da Pantanal fabricadas até então e deu-lhes duas opções: devolver a picape e receber o dinheiro (cerca de R$ 70 mil) de volta ou assinar um termo de compromisso isentando a Ford de responsabilidade em caso de acidente.
Explica-se: ao assumir a Troller, a Ford inspecionou seus carros e detectou na Pantanal "o risco do aparecimento de trincas no chassi, que, com o tempo, podem se propagar e comprometer sua durabilidade e integridade".
Como julgou que o problema era irreparável, decidiu recolher os 77 exemplares e destruí-los.
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