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Mudança em lei contraria Bolsonaro e deixa exame toxicológico mais rígido

Uriel Punk/Futura Press/Estadão Conteúdo
Imagem: Uriel Punk/Futura Press/Estadão Conteúdo

Colunista do UOL

08/07/2020 09h57

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No último dia 24, a Câmara dos Deputados aprovou o substitutivo apresentado pelo deputado Juscelino Filho, relator do Projeto de Lei (PL) 3267/2019 - encaminhado em junho do ano passado pelo presidente Jair Bolsonaro.

Uma das propostas originais de reformulação do Código de Trânsito era extinguir a obrigatoriedade do exame toxicológico para motoristas profissionais. Contudo, antes da votação, ela foi modificada pelos parlamentares, e o novo texto propõe a manutenção do teste e a criação de uma infração para punir os condutores que não o realizam dentro do prazo.

Diante da possibilidade de o PL ser aprovado e sancionado, é importante saber quem será obrigado a realizar o exame e quais as punições previstas para o descumprimento dessa regra.

Exame toxicológico é obrigatório regularmente

O exame toxicológico de larga escala de detecção se tornou obrigatório em 2015, com a Lei nº 13.103 (a famosa Lei do Motorista), para habilitação e renovação da CNH nas categorias C, D e E. Sua obrigatoriedade está determinada no art. 148-A do CTB.

O exame verifica, numa janela de 90 dias retroativos à sua realização, o consumo de substâncias psicoativas que comprometam a capacidade de dirigir. Anfetamina, cocaína e morfina são algumas das drogas detectáveis no teste, que deve ser realizado na metade da validade da habilitação.

Conforme o art. 148-A, §§ 2° e 3° do CTB, o exame deve ser realizado a cada 2 anos e 6 meses por condutores com habilitação válida por 5 anos. Se a validade da habilitação for 3 anos, a cada 1 ano e 6 meses. Em caso de reprovação no teste, o condutor deve ter a carteira suspensa por 3 meses, devendo realizar novo exame e obter resultado negativo ao fim desse período, para recuperar o direito de dirigir (art. 148-A, § 5°, CTB).

PL 3267/2019 propôs fim do exame toxicológico

A redação inicial do PL 3267/2019 não propunha apenas afrouxamento da lei em relação ao exame toxicológico. A proposta do governo federal era eliminar definitivamente essa exigência para simplificar a obtenção e renovação da habilitação para os motoristas profissionais.

Em diversas ocasiões, inclusive, o presidente Jair Bolsonaro defendeu essa e outras alterações no CTB (como o aumento do limite de pontos na CNH) para auxiliar essa categoria de profissionais.

O possível fim do exame toxicológico gerou debates entre especialistas em segurança no trânsito, e não foi aceito pela Comissão Especial que analisou o texto. Em vez disso, a redação final do PL 3267/2017 mantém o exame e ainda apresenta um novo artigo sobre o tema a ser incluído no CTB.

Não fazer exame toxicológico poderá gerar multa gravíssima

Na contramão da proposta anterior, o novo texto do PL 3267/2019 propõe maior rigidez na obrigatoriedade do exame toxicológico. Com a inserção do art. 165-B no CTB, os condutores das categorias C, D e E que não realizarem o exame em até 30 dias após o vencimento do prazo previsto no art. 148-A estarão cometendo infração gravíssima.

E as punições para o cometimento dessa infração serão bastante severas. A multa gravíssima, que recebe fator multiplicador 5, custará R$ 1.467,35. Além disso, o motorista ficará proibido de dirigir por 3 meses, tendo de ser aprovado em novo exame toxicológico para recuperar sua habilitação.

Ainda, receberá as mesmas penalidades o condutor que exerce atividade remunerada com o veículo e não comprovar a realização do exame periódico em caso de renovação da CNH.

No novo texto do PL, o art. 148-A do CTB teve sua redação alterada. Atualmente, o referido artigo determina que os condutores das categorias C, D e E devem se submeter a exames toxicológicos para habilitação e renovação da CNH. Se a nova redação for aprovada, o art. 148-A determinará que os condutores comprovem resultado negativo em exame toxicológico nesses casos.

A periodicidade do exame também faz parte das possíveis mudanças no CTB. Um novo teste deverá ser realizado a cada 2 anos e 6 meses por condutores com idade inferior a 70 anos, independentemente da validade dos exames de aptidão física e mental. Lembrando que a renovação da CNH também é alvo de mudança do PL 3267/2019.

Exame toxicológico diminui mortes no trânsito

O possível fim da obrigatoriedade do exame toxicológico agradou muitos motoristas profissionais, mas preocupou especialistas em segurança no trânsito. Isso porque, desde que passou a ser obrigatória, a realização desse exame diminuiu o número de acidentes e mortes nas estradas em decorrência do uso de drogas.

Segundo dados da PRF (Polícia Rodoviária Federal), antes da exigência do exame, era significativamente maior o número de acidentes nas rodovias federais envolvendo veículos pesados.

Isso coloca o exame como um importante instrumento de segurança no trânsito. No primeiro semestre de 2016, houve redução de 38% dos acidentes envolvendo caminhões nas estradas federais, se comparado ao mesmo período em 2015.

Considerando que o uso de substâncias ilícitas por condutores dessas categorias tem relação com o aumento da jornada de trabalho, o exame obrigatório trouxe benefícios para esses profissionais. Sua extinção poderia ser justificativa para o aumento da jornada de trabalho desses condutores e seria grande a probabilidade de serem ainda mais pressionados a cumprir entregas em menos tempo.

Além dos efeitos provocados pela substância ilícita, o organismo do condutor também precisaria lidar com a exaustão em razão do excesso de horas ao volante. Nem é preciso dizer que isso coloca em risco a sua vida e a de outras pessoas no trânsito. É por essa razão, inclusive, que nem todos os motoristas profissionais se mostraram favoráveis à extinção do exame.

No último relatório do DPVAT, por tipo de veículo, as indenizações pagas a caminhões, pick-ups, ônibus, micro-ônibus e vans representam 6% do total (quase 20 mil) de indenizações pagas em 2019.

Segundo estudo da Confederação Nacional do Transporte, os números de acidentes com vítimas envolvendo caminhões causados pelo uso de substâncias psicoativas e álcool sofreu oscilação entre 2015 e 2018, mas demonstrou redução desde o início da obrigatoriedade do exame. Com a manutenção do toxicológico e a previsão de novas penalidades, espera-se que esses números também sofram reduções.

Mudanças ainda não estão valendo

Embora tenha sido aprovado na Câmara, o PL 3267/2019 - em tramitação desde 4 de junho do ano passado - ainda precisa ser aprovado pelo Senado e sancionado pelo presidente para, então, se tornar lei. Ainda, em caso de alteração no Senado, retornará para uma nova votação na Câmara dos Deputados.

Após aprovação nas duas casas e sanção presidencial, o texto ainda levará 180 dias para entrar em vigor. Por enquanto, o PL aguarda análise dos senadores, e continuam valendo as regras atuais do Código de Trânsito.