Conteúdo publicado há 18 dias

Quem foi Xica Manicongo, 1ª trans do Brasil e enredo da Paraíso do Tuiuti?

Xica Manicongo é considerada a primeira travesti não indígena do Brasil e teve sua história contada pela Paraíso do Tuiuti. Escola de samba desfilou nesta noite no último dia de desfiles do Grupo Especial do Rio de Janeiro.

Quem foi Xica Manicongo?

Xica foi uma pioneira no século 16, nascida no Congo e foi trazida para o Brasil escravizada. Ela é tema da Tuiuti com o samba-enredo "Quem tem medo de Xica Manicongo?".

Considerada a primeira travesti do Brasil, Xica viveu em Salvador e trabalhou como sapateira na Cidade Baixa. As informações foram colhidas de acordo com registros de documentos oficiais arquivados em Lisboa (Portugal).

Conforme a Casa Um, projeto que acolhe jovens de 18 a 25 anos LGTBQIAP+, seu sobrenome Manicongo era um título utilizado pelos governantes no Reino do Congo para se referir aos seus senhores e às suas divindades. Dessa forma, podemos então traduzir o nome dela como "Rainha ou Realeza do Congo".

Em 1591, ela foi alvo de uma denúncia feita pelo Tribunal do Santo Ofício por crime de sodomia. A denúncia foi feita pelo português Matias Moreira. Entre seus "crimes" estavam a orientação homossexual e a maneira de se vestir. Por isso, foi obrigada a usar vestes masculinas e responder pelo nome também masculino, que recebeu quando chegou ao Brasil.

Xica era lembrada através do seu nome morto [Francisco] e até apontada como homem, todavia sua história foi resgatada levando em consideração a intersecção com gênero e sexualidade.
contextualizou a geógrafa e ativista Sayonara Nogueira, presidente do Instituto Brasileiro Trans de Educação.

Ela se recusava a usar indumentárias masculinas da época e acabou sendo acusada de sodomia e de fazer parte de uma quadrilha de feiticeiros.
disse Sayonara a Deutsche Welle.

Paraíso do Tuiuti levará a história de Xica Manicongo para a Sapucaí
Paraíso do Tuiuti levará a história de Xica Manicongo para a Sapucaí Imagem: Instagram/@rsantosarantes

O Tribunal do Santo Ofício era representado por um padre-visitador no Brasil colonial. Para não ser queimada em praça pública, acabou se resignando a "abrir mão de se vestir como lhe convinha", como descreve num artigo a psicóloga Jaqueline Gomes de Jesus, professora da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ).

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Para a geógrafa Sayonara Nogueira, trazer à tona histórias como a de Xica Manicongo é importante. Ela explica: "Pelo fato de se tornarem símbolos de luta e resistência para nossa comunidade, (...) além de sensibilizar e trazer visibilidade às pessoas trans na atualidade".

Infelizmente, a extrema direita vem nos transformando nas novas marginais do século 21. Existe uma perseguição diária aos nossos corpos e direitos, como uma nova Inquisição. Ainda nos são negados direitos básicos. Portanto, a história de Xica Manicongo escancara toda a violência a que somos submetidas no decorrer do tempo, até a atualidade.
Sayonara Nogueira

Xica Manicongo sofreu um apagamento histórico por séculos de pesquisadores, e a insurgência de sua identidade travesti fortalece a luta trans e travesti num país que diariamente vilipendia nossas existências. Sua história evidencia hoje os desafios que enfrentamos, principalmente quando fazemos o recorte racial, sendo que as travestis pretas são as que mais sofrem violações de direitos humanos [e morrem].
complementou Sayonara a Deutsche Welle.

Quatro mulheres trans e travestis personificaram a Xica Manicongo no desfile. "A primeira, na comissão de frente a dançarina, coreógrafa, professora e performer Daniela Raio Black, depois a cantora Hud, representando a Xica no Reino do Congo, ela como a sacerdotisa quimbanda", falou o carnavalesco Jack Vasconcellos à Agência Brasil.

Também teve a representação da inquisição em Salvador no Brasil colonial português: "Depois [da Daniela e Hud, temos] a cantora trans Pepita no carro de Salvador, representando Xica escravizada, e depois em um tripé no meio de uma ala com coreografia sobre a inquisição em Salvador, com a Bruna Maia representando a Xica e a fogueira da inquisição".

Quando o enredo pergunta, no título, 'Quem Tem Medo de Xica Manicongo?', queremos colocar as pessoas contra a parede e, ao mesmo tempo, aproximá-las. A gente quer acabar com o medo das duas partes, tanto da comunidade trans e travesti, porque são vítimas de violência constante, e também de uma parte da sociedade que não convive com essas mulheres incríveis.
Jack Vasconcelos, carnavalesco da Tuiuti, em entrevista ao UOL

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*Com informações do UOL (12/06/2022, 21/02/2025), Deutsche Brasil e Agência Brasil

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