Afinal, por que tanta gente odeia a Beija-Flor?
Vem Carnaval, vai Carnaval, uma pergunta persiste: por que existe um ódio tão grande em relação à Beija-Flor, uma das maiores vencedoras do Grupo Especial? Entre as agremiações fluminenses, ela costuma ser um dos maiores alvos de críticas, apesar de sua trajetória de sucesso. De acordo com especialistas, é uma questão complexa.
Durante a apuração dos desfiles do Carnaval 2020, na última quarta-feira (26), as pessoas faziam questão de bradar seu desprezo pela escola de Nilópolis nas redes sociais, o que tornou a pergunta ainda mais pertinente.
"A Beija-Flor é muito popular e querida pelo povo, pelas classes populares, toda área de Nilópolis tem muito orgulho da Beija-Flor. Quando ela entra na Sapucaí é sempre ovacionada. Quem não gosta da Beija-Flor, faz críticas a ela, são os formadores de opinião, os entendidos de escola de samba ou os torcedores das outras escolas", esclarece a historiadora Rosa Maria Araújo, autora do livro "Rio: A Vocação do Prazer".
Ela conta que existe uma questão histórica a ser colocada: a Beija-Flor introduziu um estilo luxuoso ao Carnaval, o que a levou a ser tricampeã em 1976, 1977 e 1978. Entretanto, ela afirma que isto costuma ser malvisto em alguns setores.
"A primeira vez em que a Beija-Flor foi campeã, ainda não existia o Sambódromo, o desfile ainda acontecia na avenida Presidente Vargas, foi uma surpresa total porque só as quatro grandes tinham sido campeãs: Império, Portela, Mangueira e Salgueiro. Eu me lembro até que teve um casal suíço para quem eu perguntei: de qual escola vocês gostaram mais? 'Aquela azul e branca, a mais bonita'. Tinha sido o que gente chama 'Carnaval do Alto'. Aqueles carros alegóricos enormes, maravilhosos. Se iniciava um novo estilo de Carnaval, em que era muito importante o visual da escola e os carros serem bonitos, o luxo", relata ela.
Ela conta que o estilo luxuoso foi introduzido por Joãosinho Trinta, um dos mais famosos carnavalescos, que permaneceu 17 anos na escola e que alterou a forma como se pensavam os desfiles das escolas de samba.
"Pode ser que rejeitem um pouco o Carnaval do luxo. Tanto que em 1982 a campeã foi a Império Serrano com 'Bumbum Paticumbum'. Houve uma reação a esse tricampeonato [da Beija-Flor], que era o Carnaval do luxo, e o Império fez o enredo contra as superescolas de samba, dizendo que era uma covardia aquele luxo e aquele dinheiro todo", frisa ela.
A opinião da historiadora é compartilhada pelo romancista Alberto Mussa, um dos jurados do Estandarte de Ouro, que premia as melhores escolas de samba do Carnaval carioca.
"Eu sinto um pouco certa resistência às vezes à Beija-Flor. Dentro de uma certa camada social, a exaltação do luxo é antipática, porque ela é exatamente a apologia da riqueza, da capacidade financeira. O dinheiro é uma coisa antipática entre uma camada que considera o dinheiro um mal", esclarece ele.
Mussa e Araújo relembram uma frase de Joãosinho Trinta que ficou célebre em relação à questão do luxo da Beija-Flor: "O povo gosta de luxo, quem gosta de pobreza é intelectual."
"Isso é uma polêmica entre o luxo e o samba no pé. O que a gente chama de 'Carnaval do Alto e o 'Carnaval do Chão'", esclarece Rosa Maria.
"No Carnaval, os pobres que não têm acesso ao luxo no dia a dia querem viver aquela experiência. O Carnaval é o momento alternativo, da fantasia. Acho que a origem dessa antipatia em uma certa camada da sociedade, mais intelectualizada, tem a ver com essa afirmação do luxo. A Beija-Flor é o luxo, exuberância, plástica. Gasta sem pudor e sem vergonha de dizer que está gastando dinheiro", destaca Mussa.
Alberto Mussa também destaca que a figura do patrono da escola, Anísio Abraão David, é recebida com antipatia, mas reforça que acredita que o maior ponto de discórdia é mesmo o poder financeiro da escola.
"Eu acho que na verdade é uma conjunção de fatores, mas principalmente relacionada à capacidade financeira da escola, que coloca carnavais luxuosos na avenida e ganha sistematicamente."
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