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Celular novo agora? Com grana curta e crise, salvar modelo antigo é solução

Rodrigo Calixto, de Campinas (SP): "em seis horas estava com o celular na mão" - Arquivo pessoal
Rodrigo Calixto, de Campinas (SP): "em seis horas estava com o celular na mão" Imagem: Arquivo pessoal

Felipe de Souza

Colaboração para Tilt, em Campinas (SP)

01/02/2021 04h00

O celular caiu e a tela trincou toda. Foi o suficiente para o coração do coordenador de operações de teleatendimento Rodrigo Calixto, 38, de Campinas (SP), parar na boca. O aparelho é sua principal ferramenta profissional, então não poderia ficar muito tempo parado.

"Logo passei a ver modelos mais novos que tanto desejamos. Então me deparei com os preços do final de ano. Como o celular é fundamental para o trabalho, procurei o reparo. Levei para uma assistência técnica e em menos de seis horas o smartphone estava na minha mão, arrumado", disse a Tilt.

O coordenador de operações não foi o único que teve a ideia. Por causa da pandemia do coronavírus, as assistências técnicas que consertam celulares registraram aumento na procura, especialmente após as medidas de isolamento e distanciamento social.

Na assistência Hubble, em Porto Alegre (RS), por exemplo, esse crescimento chegou a 50% entre os meses de março e setembro do ano passado. "O serviço mais procurado foi a troca de bateria. O aumento do uso fez com que os clientes percebessem que suas baterias não duravam tanto quanto desejado", conta Victor Abs, 34, proprietário da empresa.

Mesmo com o preço do serviço ficando mais caro por causa da demanda —aproximadamente 30% maior em relação ao pré-pandemia— os clientes ainda preferem consertar do que gastar em um telefone novo.

Loja Hubble, em Porto Alegre (RS), notou aumento de 50% nos reparos - Divulgação - Divulgação
Loja Hubble, em Porto Alegre (RS), notou aumento de 50% nos reparos
Imagem: Divulgação

Isso se refletiu na venda de telefones novos. Um levantamento da consultoria IDC Brasil mostra que a queda nas vendas foi de 8,7% no primeiro trimestre do ano passado e de 30,7% no segundo trimestre.

Segundo Renato Meireles, analista do setor de celulares da IDC Brasil, a crise provocada pelo coronavírus prejudicou o mercado. "No início do ano tínhamos um cenário favorável, mas a pandemia afetou praticamente todos os setores e não foi diferente com o mercado de celulares, que sofreu com a falta de componentes da China e com o aumento de preços devido ao dólar", afirmou.

Auxílio emergencial vai para o celular

Mesmo com a queda no índice geral, o terceiro trimestre do ano passado registrou alta de 10% na venda de celulares. Para o IDC Brasil, isso é reflexo da reabertura do comércio e um sinal de que o consumo está voltando a acontecer.

Meireles aponta que o auxílio emergencial foi um dos fatores que levaram a esse número positivo, mas acredita que o ecommerce também fez diferença.

"O consumidor brasileiro tem uma cultura muito ligada ao varejo físico, de ver o aparelho na mão. E esse comportamento chamou a atenção, pois a 'virada' para o comércio online foi muito rápida, e isso ajudou a alavancar as vendas", disse.

A empresária Vivian Rodrigues Franco, 25, proprietária da Nasatec, em Campo Grande (MS), afirma que o auxílio não foi bom apenas para a compra de aparelhos novos, mas serviu também para os reparos.

Ela contou que a procura começou a aumentar em agosto, cerca de 30%. "Janeiro ainda nos surpreendeu, pois nossa projeção era baixa devido ao começo de ano, o valor do dólar, as mudanças políticas. Mas como foi o último mês em que houve o pagamento do auxílio, acabou sendo melhor que o esperado", disse.

A tendência para o quarto trimestre de 2020 —o resultado será divulgado em março— é que as vendas recuperem mais algum percentual, mas ainda longe da expectativa otimista do começo do ano.

Reparos como troca de telas e baterias dominaram serviços realizados pela Nasatec, em Campo Grande (MS) - Divulgação - Divulgação
Reparos como troca de telas e baterias dominaram serviços realizados pela Nasatec, em Campo Grande (MS)
Imagem: Divulgação

Preços nas alturas

Ainda segundo o levantamento do IDC Brasil, o preço médio de um smartphone foi de R$ 1.539 no mercado oficial, uma alta de 22,9% em relação ao segundo trimestre de 2019.

O preço levou o empresário de eventos Cristiano Dias, 28, de Porto Alegre (RS), a consertar um iPhone que caiu no chão. "Despencou foi pouco, despedaçou a tela", brinca. Também sem poder ficar com o aparelho parado, rapidamente começou a analisar as situações.

"Não estava querendo gastar muito. O dólar estava muito alto, e o preço muito elevado. Foi aí que decidi procurar uma assistência técnica. Gastei muito menos, e o celular estava comigo de novo em menos tempo que se eu tivesse comprado via internet, por exemplo", diz.

Clayton Mangulin, chefe da Campinas Celulares, rede de assistências técnicas no interior de São Paulo, considera o tempo como um fator fundamental. Ele contabilizou aumento de 30% na procura a partir de março. Os serviços mais comuns realizados na rede não demoram mais que um dia.

Empresário Cristiano Dias, de Porto Alegre (RS), consertou o celular em vez de comprar um novo - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Empresário Cristiano Dias, de Porto Alegre (RS), consertou o celular em vez de comprar um novo
Imagem: Arquivo pessoal

"Uma troca de tela, por exemplo, pode ser realizada em poucos minutos. Bateria, se a demanda está razoável, em até um dia. As pessoas estão passando mais tempo com o celular em mãos, e isso diminui a vida útil da bateria e aumenta a chance de acidentes, como quedas", afirma.

"Refurbishing"

Para Renato Meireles, o brasileiro está atingindo uma "maturidade cultural" semelhante à de países europeus. Um levantamento feito pelo analista aponta que existam no país hoje 210 milhões de smartphones, quase um por habitante. E muitos consumidores já estão no quarto ou quinto aparelho.

Como a busca por um telefone mais moderno é maior, o telefone "usado" — ou "refurbished" (refabricado), como também pode ser chamado— acaba sendo mais vantajoso. Com ele, devolve-se o aparelho ao fabricante para que ele possa reformá-lo e colocá-lo à venda novamente.

"O preço médio de um produto novo beira R$ 1.500. O valor ainda é muito alto. Nosso mercado tem um movimento muito interessante para a busca pelos produtos que são usados, ou simplesmente consertados. Um exemplo é a rede varejista, que tem aceitado telefones antigos na troca de novos", finaliza.